(*) Ucho Haddad –
Não faz muito tempo, a presidente Dilma Rousseff disse que prefere o ruído da democracia ao silêncio do totalitarismo. Se a presidente continua pensando desta forma não sei, mas certo é que à sua volta há quem acredita ser possível calar a imprensa por meio de um advogado avesso à democracia e que se presta ao papel pequeno de censor de aluguel.
Incomodada com as notícias que levam a minha assinatura, Gleisi Hoffmann recorreu à Justiça para tentar tirar do ar uma matéria que, assim como outras tantas que surgiram na mídia nacional, trata da decisão do governo petista de desestabilizar as Apaes, transferindo à rede pública de ensino, “preferencialmente”, a educação de crianças e adolescentes com necessidades especiais. A ainda ministra da Casa Civil é pré-candidata do PT ao governo do Paraná e não quer ver sua imagem arranhada junto ao eleitorado do estado.
Se a preocupação de Gleisi é preservar a própria imagem, que redobre a atenção em relação aos seus atos como política, pois não me curvarei a qualquer intimidação, independentemente de quem ouse assumir a versão tropical de Don Tomás de Torquemada, o inquisidor.
Na ação judicial, a ministra, por intermédio de seu preposto, cita que estou a serviço de partidos políticos que fazem oposição ao governo do PT. Diferentemente do que afirma a ainda ministra, a régua que mede os jornalistas amestrados pelo Palácio do Planalto não serve para auferir o meu trabalho, respeitado e admirado cada vez mais, o que explica a preocupação crescente da esquerda nacional. Assim como não confere a ilustres desconhecidos o direito de acionarem a cantilena embusteira e rançosa do Estado de exceção para calar a minha voz.
Afirma o advogado de Gleisi Hoffmann que faço parte de uma “milícia virtual”, sendo que meu interesse “é atacar adversários – leia-se, mais precisamente, os filiados ao Partido dos Trabalhadores integrantes do alto escalão do Governo Federal”. Que este senhor prove o que afirma, pois do contrário a contenda judicial sofrerá um revés, podendo tornar-se ainda maior e mais ruidosa do que se espera. Estaria o rábula de plantão a engrossar a horda dos que creem que o ônus da prova cabe ao acusado, não ao acusador? Ledo engano desse cidadão que, desconheço os motivos, sai em defesa de um partido que circula pelas vielas da impunidade exalando o perfume de Al Capone.
Pelo que sei, o Brasil ainda é uma democracia e a Constituição Federal garante, de forma tácita e cristalina, a livre manifestação do pensamento. E tal direito exercerei em sua plenitude até o fim da minha existência, sem me deixar intimidar por qualquer ser que faz da proximidade com o poder a senha para ataques descabidos. De tal modo, deveria saber o tal senhor que defende a ainda ministra que não há no País lei que proíba qualquer cidadão de discordar do Partido dos Trabalhadores ou do Governo Federal. Da mesma forma não existe previsão legal, pelo menos por enquanto, que limite a quantidade de críticas aos donos do poder. Sendo assim, continuarei a exercer com responsabilidade e firmeza de opinião o ofício que escolhi e ao qual me dedico de maneira incansável para tentar livrar o Brasil das mãos que sustentam a incompetência e alisam a cabeça dos corruptos.
Causa estranheza, contudo, o fato de o advogado que defende a ainda ministra afirmar que causo inveja a contraventores apenas porque respondo a processos. Se essa é a baliza usada por alguém que desconhece o preceito constitucional da presunção da inocência – deveria saber, pois trata-se de uma das básicas garantias constitucionais – que assuma a sua postura inquisitória, mesmo que de aluguel seja, e exija a prisão imediata dos filiados ao Partido dos Trabalhadores que protagonizaram o Mensalão, o maior escândalo de corrupção da história nacional. Ou será que recursos e trânsito em julgado de sentenças eventualmente condenatórias são prerrogativas de petistas ilustres?
É de se estranhar a postura bisonha e dual de um operador do Direito que sai a defender, estabanadamente, um partido político que a história recente provou sua vocação quadrilheira. Se a Justiça assim não quer enxergar, pois em algumas de suas instâncias as interpretações da lei se dão de acordo com a necessidade da clientela, o problema então é outro.
O Brasil caminha perigosamente na direção do totalitarismo, mesmo que de forma disfarçada, mas ainda é cedo para que alguns cidadãos adentrem à cena do cotidiano como verdadeiros carrascos de Treblinka e Dachau, querendo exterminar o direito da livre manifestação, apesar de na ação judicial em questão querer mostrar o contrário, o que cria antíteses conceituais e interpretativas.
Atesta a sabedoria popular que ninguém chuta cachorro morto. E se assim o fazem é porque estou a incomodar os que se encastelaram no poder. Para que fique clara a minha postura como jornalista, destaco, como faço em reiteradas ocasiões, citação do brilhante antropólogo e escritor Darcy Ribeiro, que deveria ser fonte de inspiração para todos os brasileiros de bem e que ainda não foram abduzidos pela milionária e enganosa propaganda oficial.
“Só há duas opções nesta vida: se resignar ou se indignar. E eu não vou me resignar nunca”.
Continuarei me indignando, porque esse é um direito nato de qualquer ser humano com massa cinzenta em pleno funcionamento, sem jamais resignar-me diante dos fatos que corroem diuturnamente o País. Se a censura retornou ao palco do cotidiano, sem qualquer prévio aviso, que os incomodados se valham da truculência camuflada que brota da referida ação judicial para calar-me.
Alega o procurador da ainda chefe da Casa Civil que, nas últimas semanas, muitas foram as matérias jornalísticas, de minha lavra, desfavoráveis à petista, mas é preciso lembrar que em momento algum coube-me a iniciativa de indicar um pedófilo para trabalhar a poucos metros da presidente da República. Não foi minha, mas, sim, da ainda ministra Gleisi Hoffmann, a decisão de levar para a Casa Civil um delinquente sexual que há mais de três anos responde a dezenas de processos por estupro de vulneráveis, sendo que o número de vítimas, em sua extensa maioria meninas menores de idade, pode chegar às centenas. Sendo assim, o tal advogado deve medir suas palavras ao dirigir-se à minha pessoa, pois ao mesmo caberá provar as calúnias que me dedica.
Outrossim, sugiro ao mesmo que desvencilhe-se do palavrório oportunista, pois uma coisa é requerer o direito de resposta, o qual sempre concedi de chofre, sem a necessidade de interveniência judicial, por entender tratar-se de prerrogativa daquele que se sente prejudicado por essa ou aquela matéria; outra é valer-se de rapapés para impressionar o magistrado que preside uma causa marcada muito mais por acusações descabidas do que pelo objetivo que a suscitou.
Tentam, a ainda ministra e seu defensor, dar ar de ilegalidade ao fato de manter um domínio eletrônico registrado no exterior, quando ilegal é movimentar dinheiro escuso em conta bancária aberta em paraíso fiscal, como aconteceu com o partido da autora no caso do pagamento de parte dos honorários do então marqueteiro da legenda.
A ainda ministra colhe os negativos dividendos da decisão de instalar na Casa Civil um pedófilo serial e conhecido, mas usar a questão das Apaes como subterfúgio para me calar é falta de imaginação. Na ação judicial, o defensor da autora exibe o ziguezaguear do seu pensamento jurídico, uma vez que cita, em dado trecho, o termo “notícia séria”, para em outro destacar “exagero doloso na manipulação da informação”. Que alguém ouse levantar a voz para, dedo em riste, acusar-me de exercer o jornalismo de maneira dolosa. Se dolo há na contenda, este manifesta-se de maneira inequívoca no escopo do projeto do Executivo federal que busca transferir à rede pública de ensino a educação dos portadores de necessidades especiais.
O dolo a que me refiro é tamanho, que um dos mais conhecidos veículos da grande imprensa nacional, o jornal “Folha de S. Paulo”, publicou notícias de teor semelhante acerca da tentativa oficial de desestabilização do valioso e sempre necessário trabalho das Apaes. O tema, que na estrutura do governo é de responsabilidade também da Casa Civil, provocou tanta perplexidade, que o respeitável senador Pedro Simon posicionou-se contra o projeto do Executivo, não sem antes defender com firmeza as Apaes. De maneira idêntica posicionou-se o deputado federal Romário de Souza Faria, que em contundente e revelador discurso no plenário da Câmara criticou a proposta do governo federal.
Disse certa feita o ex-deputado Ulysses Guimarães: “A censura é a inimiga feroz da verdade. É o horror à inteligência, à pesquisa, ao debate, ao diálogo. Decreta a revogação do dogma da falibilidade humana e proclama os proprietários da verdade”.
Não sou o dono da verdade e nem mesmo tenho a pretensão de sê-lo, mas não aceitarei que seja deflagrada uma onda de horror ao meu raciocínio, especialmente por alguém que tem dificuldades para reconhecer a própria falibilidade, assim como não se contenta com a conhecida insignificância existencial. Desde já, e como sempre, estou aberto e pronto ao bom e democrático debate, sem chicanas de botequim, concedendo de imediato o devido direito de resposta à ainda ministra, independentemente de eventual determinação por parte do juízo.
(*) Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, cronista esportivo, escritor e poeta.
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