A segurança do espaço aéreo brasileiro durante a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 terá apoio de pelo menos seis veículos aéreos não tripulados – vants, como os drones são chamados em português – da Polícia Federal e da Aeronáutica. Os equipamentos já serão usados para monitoramento durante os jogos da Copa das Confederações, entre 15 e 30 de junho, que servirá de teste para os eventos dos anos seguintes.
O Exército, que desenvolve projetos de vants com empresas e institutos de pesquisas, pediu em 2013 a abertura de um crédito suplementar na Lei Orçamentária Anual para a compra de drones, também pensando em reforçar a segurança durante a Copa.
Em 18 de fevereiro, a FAB recebeu dois aviões não tripulados feitos pela empresa israelense Elbit, que custaram R$ 48,174 milhões e serão montados em Santa Maria (RS), de onde devem operar a partir de março. Duas outras unidades do modelo, que foram enviadas em 2010 para testes, ficarão no país pelo menos até o fim do Mundial.
Uma ordem de serviço para que a tropa e os drones estejam a postos para uso foi expedida pelo Comando de Defesa Aérea Brasileira (Comdabra) e já chegou ao Esquadrão Hórus, no Rio Grande do Sul, que abriga os equipamentos, segundo o coronel Donald Gramkow, comandante da unidade.
A primeira ação de vigilância de eventos internacionais usando drones foi em 2012, quando o Brasil sediou a Rio +20 (Conferência da ONU sobre Desenvolvimento Sustentável). Militares vigiaram dia e noite o local onde mais de 100 chefes de Estado estavam reunidos. Essa ação e os aprendizados da Copa das Confederações servirão de base para a construção de uma doutrina para o empregos de drones na Copa, na Olimpíada e em possíveis outros casos.
“Na Rio +20 e nas Operações Ágata, feitas nas fronteiras pelo Ministério da Defesa, realizamos várias missões conjuntas com outros órgãos de segurança pública, com a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), Polícia Federal e instituições estaduais e federais que possibilitaram a troca de informações e de inteligência. Enquanto monitóravamos o local com o vant, em tempo real, todos podiam ver as imagens em um centro de controle de acesso restrito. Em algumas vezes, percebemos que havia algo suspeito e avisamos o policiamento em terra para agir”, afirma o coronel Gramkow.
A PF tem dois drones israelenses Heron, feitos pela Israel Aerospace Industries Ltd (IAI), que chegaram ao país em 2010 por aproximadamente R$ 80 milhões. Esses vants, que ficam na Base Aérea de São Miguel do Iguaçu (PR), são os únicos para uso civil certificados pela Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e são usados para obtenção de informações de inteligência e apoio ao combate ao narcotráfico e ao contrabando na fronteira com o Paraguai.
Os drones da PF, que estavam parados em 2012 devido a uma auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU) voltaram a operar secretamente em dezembro do ano passado, auxiliando, inclusive, na realização de prisões. O TCU informou que o processo está em andamento e ainda em sigilo, e que não poderia fornecer informações. O projeto inicial englobava 14 aeronaves ao custo de quase R$ 600 milhões. Quase R$ 80 milhões já teriam sido gastos.
Centro de controle
Cada aeronave não tripulada é monitorada de um centro de controle, onde piloto e operador de sensores contam com mais de 10 telas de vídeo para que possam, por exemplo, localizar alvos, ver a posição do avião no radar e desviar de possíveis obstáculos no percurso.
“Os soldados acompanham as imagens enviadas e podem usar ainda outros instrumentos, como sensores de infra-vermelho, raio-x e imageador radar, que pode desenhar e mapear uma região mesmo com tempo encoberto por nuvens ou mau tempo”, diz Gramkow.
Com esse recurso, é possível detectar a presença de pessoas armadas nos estádios ou nas áreas restritas aos atletas, por exemplo. Não há definição sobre que jogos serão monitorados pelos drones, mas o emprego dos equipamentos será permanente durante a Copa.
Imagens captadas por drones podem permitir que a artilharia antiáerea do Exército intercepte com maior rapidez aeronaves que, por ventura, tentarem invadir a área dos estádios. O vant israelense da FAB, chamado de hermes, tem peso máximo de decolagem de 450 kgs e voa por até 16 horas seguidas. Seu raio de alcance é de até 200 km, voando a uma altitude que varia entre 3.048 metros e 4.900 metros.
Ao contrário dos Estados Unidos, que formam pilotos especificamente para drones, a FAB optou por manter o seu piloto de vant voando outro tipo de aeronave. “Piloto ruim não é o que não sabe pilotar, mas o que não sabe decidir, o que é inseguro e pode provocar acidentes. Um piloto de vant, sentado em uma sala, precisa ter consciência situacional, saber onde está voando e o que pode ocorrer, para poder reagir rápido”, diz o coronel.
Exército estuda compra
Até 2014 deve ficar pronto o Falcão, drone de mais de 800 kg, que está sendo produzido pela brasileira Avibras com investimento do Ministério da Defesa e que será vendido pela Harpia (empresa formada por Embraer, Avibras e a israelense Elbit, uma das líderes do ramo).
O modelo está entre os favoritos para ser adquirido pelos militares brasileiros, que já realizam uma pesquisa de mercado para a compra.
Além dos eventos internacionais no país, o Exército quer usar vants no monitoramento dos 17 mil km de fronteiras que o Brasil tem com 10 países. As aeronaves farão parte ainda do Sistema Proteger, que irá monitorar a Usina Hidrelétrica de Itaipu e outros locais estratégicos para o país.
Em relação à Copa, o Exército diz aguardar mudanças na legislação em relação a operação de vants em áreas povoadas para analisar se drones de pequeno porte podem ser usados para sobrevoar as cidades-sede dos jogos.
“O drone é a evolução do poder de combate, ele sintetiza tudo. Ele tem sensores capazes de localizar qualquer coisa, consegue transmitir a informação em tempo real para qualquer lugar – o que só o drone é capaz – e pode neutralizar e eliminar a ameaça naquele exato momento. É uma arma completa”, diz o general da reserva do Exército Alvaro Pinheiro, que é especialista em terrorismo e táticas de guerra e defensor da capacidade brasileira em operar drones com armas.
“É evidente que o Brasil precisa ter capacidade de operar drones, tanto para vigilância para combater. O drone é cirúrgico, é um instrumento de apoio ao combate exatamente para diminuir efeitos indesejáveis, como a morte de inocentes ou destruição de locais errados”, defende.
América Latina
A realocação de drones americanos para a América Latina após o fim das guerras no Iraque e no preocupa os países da União das Nações Sul-Americanas (Unasul). Em 2012, o general Norton Schwartz afirmou drones de multicapacidades, que estão sendo retirados do Oriente Médio, passarão a operar na América para missões de espionagem e combate ao tráfico, em especial no Caribe, Colômbia e México.
Dias depois, em 28 de novembro, 11 países que integram o bloco deciriram construir um drone conjunto, sob comando do Brasil. No evento, realizado no Peru, o vice-presidente, Michel Temer, disse que o país já estava desenvolvendo um modelo para uniformizar o sistema de voo de aviões não tripulados na América Latina e também proteger a Amazônia.
“Há possibilidades enormes do uso militar de vants na América Latina. Mas seria um avião de maior porte e que pode até dar apoio a caças. A maior preocupação é com acidentes e riscos envolvendo sobrevoar áreas populosas. Por isso, o seu voo seria em alta altitude”, explica o capitão José Augusto de Almeida, do Departamento de Ciência e Tecnologia da FAB.
A Associação Brasileira de Produtos de Defesa (Abinde) defende que o governo adquira produtos nacionais. Dentre os made in Brasil em desenvolvimento, o Falcão é cotado até para exportação após ter recebido R$ 40 milhões de arpote do Ministério da Defesa para ser concebido.
“Estamos na fase de configuração para atender às exigências dos militares, fazer ensaios no terreno e preparar a produção de um lote piloto de quatro unidades. Alguns testes já foram feitos em Pirassununga (SP)”, diz Renato Tovar, diretor da Avibras.
“Esperamos que ainda em 2013 seja assinado com o Ministério da Defesa um contrato de desenvolvimento, no qual serão feitos ensaios de voo do Falcão”, disse ao G1 o vice-presidente de operações da Embraer, Eduardo Bonini.
“O Falcão será o nosso vant nacional. Estamos aguardando que as Forças Armadas nos enviem a configuração de sensores que precisam, para que o projeto possa avançar”, acrescentou o presidente da unidade de negócios Defesa e Segurança da Embraer, Luiz Carlos Aguiar.
Compra de vant nacional
No programa “Café com Presidenta” exibido em cadeia nacional de rádio em 21 de janeiro, a presidente Dilma Rousseff explicou para a população para que servem os aviões e destacou que vants da FAB e da PF foram usados para localizar laboratórios de refino de cocaína em operações conjuntas com Bolívia, Colômbia e Peru.
“Vant é um avião pequeno que voa sem piloto. Esse avião faz o mapeamento de regiões de difícil acesso, registrando imagens em altíssima resolução e transmitindo essas imagens. Mesmo à noite, ele consegue enxergar a ação dos criminosos sem ser percebido por eles. Com isso, os agentes identificam mercadorias suspeitas que atravessam a fronteira brasileira pelos rios, identificam garimpos ilegais e também pistas clandestinas usadas pelo tráfico”, disse Dilma.
“Nós trabalhamos pela segurança das famílias nas cidades brasileiras e por uma convivência de paz e harmonia com os países da América do Sul”, completou a presidente na ocasião.
O Ministério da Defesa informou ainda analisar a quantidade e o modelo de aeronave que será comprada, mas que “estuda ajudar a indústria nacional por meio de aquisições” .
O governo brasileiro pode, eventualmente, controlar as exportações. Além disso, em parceria com a Avibras, está sendo criado um sistema de navegação, controle e pilotagem de drones, que poderá ser utilizado em aeroportos ou vants em qualquer lugar do país.
Drone como arma
Além dos drones de vigilância, as Forças Armadas também querem ter a possibilidade de, no futuro, colocar mísseis em seus vants. O Ministério da Defesa e Avibras confirmaram ao G1 ter projetos para produção e emprego de um “drone de combate”, mas ainda estudam o tema com cautela.
“O projeto existe, mas vai ficar para o futuro. Por enquanto, o foco prioritário é vigilância e monitoramento. O assunto é ainda bastante delicado. Precisamos primeiro avançar na atuação de vants de reconhecimento”, afirmou Renato Tovar, diretor da Avibras.
O drone capaz de receber armamento teria configuração especial, com eletrônica e aviônica diferenciadas. “Isso depende também de que tipo de armas o governo gostaria de usar, para que fins, se será para o Pré-Sal, para fronteiras terrestres, etc”, completou.
“A Avibras tem uma versão futura para colocar armamento no Falcão, caso algum cliente venha a pedir. Também há um projeto para uso em patrulhas marítimas, com sensores e radares diferenciados capazes de localizar navios e submarinos no mar”, diz Flávio Araripe.
As Forças Armadas possuem, segundo o Livro Branco de Defesa Nacional, divulgado em 2012, pelo menos 8 projetos que visam a aquisição de drones, entre 2013 e 2030, tanto para vigilância do mar como controle do espaço aéreo.
Os estudos seguem a Estratégia Nacional de Defesa, decreto publicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2008, que aponta como uma de suas diretrizes básicas “programas de veículos aéreos não tripulados (vants), primeiro de vigilância e depois de combate”, se o país quiser ganhar projeção internacional e prevenir ataques a seu território nos próximos 20 anos.
Segundo o texto, os drones com armas, conhecidos como Predadores (Predator, do nome em inglês), serão para o país “meios centrais, não meramente acessórios, do combate aéreo”.
“A indústria de defesa espera um investimento maciço das Forças Armadas para alavancar o setor que, devido às atuais normas da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), não pode usar comercialmente o produto. O Brasil tem muito a crescer no uso militar dos vants”, defende Antonio Castro, da Associação Brasileira de Produtos de Defesa (Abinde).
O Ministério da Defesa ressaltou que as aplicações atualmente vislumbradas para estes veículos “são variantes da missão de reconhecimento e sem armas”, mas que “isso não significa que essas aeronaves não possam ser utilizadas em combate”.
Os Estados Unidos logo perceberam o potencial militar de drones e passaram a usar a nova tecnologia para atacar alvos no Afeganistão, Paquistão, Iêmen, Somália, além de monitorar outros países. A eficácia das missões, entretanto, é contestada por organizações de direitos humanos, que apontam um grande número de inocentes entre as vítimas dos bombardeiros e contestam a legalidade do emprego militar desse recurso. Críticos falam em “assassinatos sem julgamento”, “guerra suja” e “violação das leis internacionais”.
A Fundação Nova América, baseada em Washington, contabiliza 350 ataques desde 2004, a maioria durante o governo de Barack Obama, com número de mortos entre 1.963 e 3.293, incluindo entre 261 e 305 civis. Segundo o Escritório de Jornalismo Investigativo, em Londres, o número de vítimas fatais em ataques americanos com drones é maior, entre 2.627 e 3.457, sendo entre 475 e 900 civis. No dia 20 de fevereiro, o senador republicano Lindsey Graham, defensor do uso de drones em ataques militares, disse que o número de mortos soma cerca de 4.700 pessoas, incluindo inocentes.
Marinha usa drone nacional
Ao contrário da FAB, que optou por comprar drones de Israel, mais compatíveis com as especificações que precisava para vigiar as fronteiras do país, a Marinha usa o Carcará, um vant produzido pela brasileira Santos Lab e adquirido após uma licitação internacional.
Segundo Roberto Sbragio Júnior, diretor da empresa, os vants tem 2 metros de envergadura e pesam de 1,8 kg a 4 kg, movidos a bateria. Por serem militares, os Carcarás não precisam de autorização da Anac para operar e possuem custo de R$ 600 mil a unidade.
Os veículos da Marinha estão no Batalhão de Controle Aerotático e Defesa Antiaérea, no Rio de Janeiro, e são usados desde 2007, quando foram empregados pela primeira vez em uma manobra de adestramento em Itaoca (ES). Em 2009, os fuzileiros receberam duas novas unidades, de um modelo de nova geração, que servem para inteligência.
A ideia agora é aplicar os drones embarcados em navios ou porta-aviões na costa brasileira para diagnosticar possíveis invasores. Até 2030, a Marinha pretende comprar mais 10 unidades: os primeiros cinco devem chegar até 2022. Os aviões serão usados para busca e salvamento em alto mar, monitoramento de plataformas de petróleo e reconhecimento de embarcações envolvidas em pesca predatória, extração mineral, pirataria, contrabando e crimes ambientais.
FONTE: Portal G1
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