segunda-feira, 5 de março de 2012

SEXTO CAPÍTULO DA "GUERRILHA DO ARAGUAIA"



     A história que não foi contada  


                  

                          


6º capítulo





A grande farsa dos "heróis revolucionários e 

defensores da democracia"



A Guerrilha do Araguaia



Neste capítulo, as narrativas serão do Cel Lício Maciel, extraídas do seu livro , "Guerrilha do Araguaia": Os Primórdios; As Operações; A Descoberta da Grande Área.
A prisão de José Genoíno Neto ou "Geraldo". 





Lourinaldo Teles Bezerra


" Seu nome é sacrifício. Por ofício desprezam a morte e o sofrimento físico.
Seus pecados mesmo são generosos, facilmente esplêndidos.
A beleza de suas ações é tão grande que os poetas não se cansam de celebrar.
Quando eles passam juntos, fazendo barulho, os corações  mais cansados sentem estremecer alguma coisa dentro de si. A gente conhece-os por militares."





Considerações sobre a época dos combates




Na época em que aconteceram os primeiros enfrentamentos entre as forças legais e os guerrilheiros do PC do B, na selva do sul do Pará no ano de 1973, após demoradas propostas de rendição que duraram meses, feitas pelo Exército Brasileiro aos comunistas armados e comandados por Maurício Grabois, o Brasil havia entrado no período áureo de seu desenvolvimento.

Sob o Governo do Presidente Emilio Garrastazu Médici, que não media esforços no sentido de melhorar o País, tirando-o de uma posição incômoda perante o restante do mundo daquela época e o posicionando no verdadeiro lugar a ele reservado, o nosso Brasil emergia como um milagre econômico.

Referindo-se ao Brasil de Médici, o escritor marxista e fundador do PCBR, Partido Comunista Brasileiro revolucionário, Jacob Gorender, que se encontrava preso no Presídio Tiradentes e já citado nesse documentário, descreve sua participação como ministrador de palestras sobre a História do Brasil dentro da prisão onde se encontrava: 

" Durante ano e meio, sempre às noites de segunda-feira, fiz palestras sobre a História do Brasil. O entra-e-sai variava o público. A platéia poderia ter dez ou 25 ouvintes, conforme os momentos de quedas na esquerda. Poucos presos ouviram o curso da primeira à última palestra, quando abordei o Governo Médici e escandalizei alguns sociólogos presentes ao afirmar que a economia brasileira não sofria de estagnação estrutural e atravessava uma fase de auge expansionista."

O choque provocado pelas palavras de Jacob Gorender nos sociólogos presentes à sua palestra, se deve ao fato de que existia na Europa, à época, uma campanha difamatória contra o Governo brasileiro, promovida por elementos da esquerda ativa, tais como Miguel Arraes (PSB), Leonel Brizola (PTB), D. Helder Câmara (Teologia da Libertação), Apolônio de Carvalho  (PCBR partido de Jacob Gorender), Ladislas Dowbor da VPR, Jean Marc Von Der Weid, da AP, JoséMaria Crispim (PC), Almino Afonso e outros. 

Esses elementos faziam parte da cúpula da FBI - Frente Brasileira de Informações, uma organização fundada para difundir mentiras sobre todos os tipos de assuntos que se referissem ao Governo Brasileiro. 

Essas informações fraudadas ganhavam maior importância quando eram pregadas por um clérigo do peso de D. Helder Câmara, conhecido há já bastante tempo nos países europeus onde participava de congressos e palestras de cunho religiosos ou sociais do "clero progressista" da América Latina.

O centro dessa campanha difamatória tinha como sede Paris, onde no dia 15 de janeiro de 1970, no Centro de Convenções Mouber Mutualité, pertencente aos sindicatos comunistas de Paris, a "Reunião de Solidariedade com o Povo Brasileiro", tendo ao fundo um grande mural com a fotografia de Carlos Marighela, foi prestigiada por personalidades da esquerda mundial.

Mas, o Brasil, sob a batuta do Presidente Médici, galgou imensos degraus na subida ao progresso e desenvolvimento social do nosso povo, assim como no setor industrial, energético, transporte, portuário, aeroportuário, científico, exportação, pesquisas agropecuárias (EMBRAPA), petróleo, etc. 

Apesar da intensa campanha difamatória empreendida no exterior por maus brasileiros, essa não conseguiu o sucesso esperado, visto que os negociantes, diplomatas e mesmo os turistas que para aqui vinham, podiam atestar o contrário do que se pregavam lá fora e desmentir tais informações consolidando o prestígio que o Brasil conquistava com o passar do tempo.

Outro fator que ajudou na derrocada da campanha negativa da FBI foram os desentendimentos ocorridos entre membros dessa organização, que fizeram com que ela se enfraquecesse e fosse definhando por absoluta falta de coerência em suas afirmações falsas na medida em que seus membros se distanciavam dos objetivos iniciais propostos.

Na Argélia, de onde provinham grande parte dos recursos necessários para a campanha de difamação do Brasil, Miguel Arraes se desentendia com outro brasileiro ali refugiado, Silvio Lins, na partilha dos dólares oriundos das comissões provenientes dos negócios a que estavam afeitos por concessão do governo argelino com a Central Elétrica de Annaba e suas linhas de transmissão, que renderiam a eles cerca de US$ 3 milhões de dólares em comissões e que deveriam ir para o fundo do Movimento Popular de Libertação, fundado por Silvio e Arraes, o que provocou imensa discórdia entre os dois. 

Arraes não concordava que fosse destinado tanto dinheiro para a revolução e queria uma parte dessa grana o que provocou a briga entre os dois comunistas de Pernambuco. A ganância e a corrupção que dela se originou, dentro do governo argelino, fez com que Boumedienne, - presidente da Argélia, e que recepcionou Arraes, na sua chegada ao país africano, com honras de estadista - expulsasse Miguel Arraes com desonra do país que o acolhera.



O livro "Médici", do Gen Div Agnaldo Del Nero Augusto, é um depoimento precioso sobre esse período marcante da História Moderna do Brasil. Nele, iremos encontrar quase todas as realizações (quase todas, porque foram tantas que seria praticamente impossível relacioná-las totalmente num só livro de apenas 262 páginas) desse Governo, que foi elogiado até por ex-ativistas comunistas como o famoso escritor acima citado e pelo próprio Luiz Inácio Lula da Silva, que deu uma entrevista a Ronaldo Costa Couto em 03/04/1997 e declarou o seguinte "... o regime militar impulsionou a economia do Brasil de forma extraordinária. (...) Se houvesse eleições, o Médici ganhava."

Foi nesse período de grande revolução desenvolvimentista que os combates na selva do Araguaia tiveram seu início.

Seria desnecessário dizer-se que isto seria inacreditável, caso os comunistas quisessem o bem do Brasil e de seu povo. Com os brasileiros querendo a melhoria de vida num País que carecia de tudo, inclusive de bens de primeira necessidade, deflagrar uma guerra de guerrilha seria impensável. Mas, a sanguinária ânsia de poder dos comunistas era cega aos acontecimentos da época.

O Ten Cel Ref Lício Augusto Ribeiro Maciel, autor da prisão de José Genoíno e um guerreiro exemplar na luta contra os guerrilheiros do Araguaia, em seu livro: 'Guerrilha do Araguaia - Relato de um combatente', descreve em minúcias e com precisão sua participação na campanha. 

Com professoral estilo, o Cel Lício explica cientificamente como é ambientar-se na selva amazônica e suas dificuldades extremas quando da perseguição e enfrentamento dos guerrilheiros num ambiente hostil como uma selva tropical.

Não seria possível obter-se resultados positivos na guerra de guerrilha se as tropas empregadas na campanha não possuíssem o treinamento especializado em selva. Seria jogá-las às piranhas.

Começa agora o penúltimo capítulo dessa magnífica epopéia acontecida numa das regiões mais inóspitas do Brasil.

O Cel Lício Maciel dá sua contribuição relevante à História com seus relatos cheios de brilhantismo didático como segue.




Os primórdios 


                                                                                                      
A imprensa tem sistematicamente publicado versões fantasiosas e mentirosas de alguns combates e incidentes da guerrilha do Araguaia. São versões "por ouvir dizer", escritas maliciosamente por quem não tem a mínima idéia do que seja um combate, muito menos na selva.Sem exceção, são todos eles,jornalistas d esquerda, comunistas e inocentes úteis.Os anticomunistas e realistas desapareceram, silenciaram.

Se os poucos militares combatentes ainda vivos, participantes, se omitirem, ficará valendo a versão dos derrotados. Deixo aqui o meu convite, verdadeiro apelo, aos reais combatentes para que deixem o seu depoimento, suas versões dessa fase difícil, dessa verdadeira guerra.

Os primeiros mortos na luta do Araguaia foram quatro militares e um morador que tinha servido de guia para a minha primeira patrulha que entrou na selva; só depois começaram as baixas dos guerrilheiros. Isto é uma demonstração irrefutável de que os militares agiam com comedimento, com cuidado para que não haver enganos nem excessos.

Foram dadas inúmeras e demoradas oportunidades para que eles se entregassem: o local foi descoberto em 1072 e só foi neutralizado em 1974. Com a descoberta das áreas dos três grupos, seria muito fácil, por exemplo, empregar a Divisão de Pára-quedistas para neutralizá-los em curto prazo. Mas isto não foi feito; foi adotada uma solução humana, demorada e, inclusive, mais arriscada para os militares. Muitas outras soluções instantâneas poderiam ter sido adotadas.

Após terminada a operação Sucuri, em setembro de de 1973,inúmeras vezes foram lançados panfletos e transmitidas mensagens por megafone por meio de aeronave a baixa altura, concitando a que se entregassem, com garantia de julgamento justo, tratamento humano e imparcial. Não surtiu efeito; eles se decidiram pelo confronto e assim aconteceu.

No início de 1974, ainda convalescendo, cumpri várias dessas missões, embora a pressão atmosférica na cabeça (face e ouvido), ainda me exigisse um grande esforço. Voávamos em grandes círculos e exatamente sobre a área dos acampamentos dos guerrilheiro, lançando os panfletos, numa demonstração clara de que sabíamos exatamente onde eles estavam.

Dizem eles, mesmo assim, inconformados com a derrota, que esta demora de eliminação do foco, foi por incompetência do EB. A despeito da anistia e de mais de trinta anos já terem se passado, mantêm o mesmo ódio inicial contra o Exército particularmente e, agora, ainda buscam indenizações.

Quando os militares chegavam na área eles se escondiam em refúgios muito bem planejados e preparados, verdadeiras "tocas de onça", à beira de um córrego de águas cristalinas, como muito conforto, ficavam dormindo. Só saiam quando não havia mais perigo e se vingavam da população que teve contato com os militares. Assim, era realmente muito difícil achá-los naquele verdadeiro palheiro;  a tática  deveria ser outra, claro.

Hoje tentam tornar crível uma série de mentiras, que sugerem aos moradores da área, com interesses pecuniários, que repetem. Mas contra fatos não há argumento.O PC do B tem por problema a foice e o martelo, além do próprio nome revelador.

Todos os componentes do grupo militar da guerrilha, encabeçada por Zé Carlos ( André Grabois ), foram formados em terrorismo nos países comunistas. E, mesmo assim, querem convencer que lutavam contra a ditadura. 


Já estavam em treinamento muito antes de 64, logicamente para tomar o poder, fosse qual fosse o regime. Em 1952, Marighela estava na Academia Militar de Pequim, aprendendo as mais vis torpezas a serem impostas a seus conterrâneos. Em 1935, já tinham tentado comunizar o País, assassinando traiçoeiramente inúmeros militares enquanto dormiam e um grande número de civis contrários ao movimento. No início de 1964, André Grabois, do PC do B, foi fazer curso de terrorismo em Cuba, juntamente com outros militantes que comporiam o grupo militar da guerrilha. Era essa democracia de Cuba que gostariam de impor aos brasileiros?


Meu grupo de combate sempre operou com cerca de 10 militares. Suas ações foram sempre revestidas de muita eficiência. Considerando cerca de uma dúzia de ações, com as substituições a cada ação, há no mínimo 70 militares participantes em condições de escrever suas "memórias", sem incluir os que tenham falecido. como eu era o mais velho dentre todos, considerando 20% de falecimentos, poderá haver cerca de 50 futuros escritores  , "testemunhas oculares da história"... E, tenho absoluta certeza, nenhum se passou para o outro lado! Nenhum virou bajulador de comuna.

Embora eu tenha passado mais de trinta anos afastado de qualquer alusão ao assunto guerrilha, as lembranças são inevitáveis. No me caso, essas lembranças eram muito espaçadas no tempo.No entanto, o revanchismo fez com que eu me convencesse de que estava na hora de começar a falar diante de tanta mentira, foi impossível ficar calado.


O motivo pelo qual incluí as considerações do Cel Lício Maciel, a respeito de suas impressões e dos fatos históricos que relatam as atitudes do comunistas através dos tempos é para corroborar narrativas anteriores, onde me referi ou foram referidas por outro autor nesse relato. É preciso que fiquem bem claras as intenções desses elementos na condução da guerrilha no centro-oeste brasileiro e como elas foram concebidas e executadas naquele teatro de guerra.

Nunca houve a intenção clara de libertar o Brasil das "garras da ditadura cruenta" que fora implantada pelos militares. Na verdade, o intuito deles, digo mais uma vez, era a implantação de um regime ditatorial comunista à imagem dos existentes na Europa, América Central e Ásia, sem falar dos pobres países africanos que já começavam a sofrer com as incursões dos marxistas em Angola e Moçambique, destruindo tudo o que fora construído pelos colonizadores ao longo dos tempos deixando a terra arrasada para seus nativos. Em nenhum lugar por onde os comunistas passaram existem ou existiu liberdade e nem progresso, apenas destruição e tragédias. Os exemplos são muitos, desde a Europa até os confins da Ásia dominada por chineses comandados por Mao Tsé Tung e depois por seus sucessores.

A história do comunismo é lavada com tanto sangue que a cor da bandeira representativa dessa gangrena é o emblemático vermelho. 

Stalin, em seus anos de ditadura sangrenta, tinha imenso desprezo pela vida humana e mandou executar após julgamentos sumários ou não, mais de 28 milhões de pessoas apenas dentro da União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS).

Em Cuba, dos irmãos sanguinários Castro, o morticínio não foi menor se considerarmos a população dos dois países, URSS e Cuba. Estima-se que os revolucionários cubanos tenham assassinado, ao longo desses 53 anos de tirania sangrenta, mais de 80.000 seres humanos por razões que vão de protestos contra a ditadura a tentativa de fuga da ilha prisão. 

No Brasil, por muitas décadas, esses miseráveis tentaram lançar suas garras sobre o povo brasileiro; não conseguiram, graças às heróicas Forças Armadas Brasileiras que cumpriram rigorosamente o seu papel de defensor constitucional da Pátria.

Dando prosseguimento às narrativas do Cel Lício Maciel:



As operações 

Em 1969, começavam a ser detetadas as investidas na área rural, já que o terrorismo estava sendo derrotado nas cidades.

"Foi como atirar no fantasma de Marighela e acertar no Molipo" - comentário, na época, do Cid, bravo guerreiro de minha equipe.

Dentre as várias operações contra os terroristas (Molipo - Grupo da Ilha - Grupo Primavera), antes de descoberta da área da guerrilha do Araguaia, ao longo da rodovia Belém-Brasília, descrevo as que comandei.

Operação em que tombou o terrorista Jeová Assis Gomes, que reagiu à voz de prisão no campo de futebol da Rodobras em Guará I (ou Guaraí), lotado, durante uma partida de futebol do time local com o Araguaína (era o Fla-Flu de lá), com prisão de outro terrorista (Boanerges de Souza Massa). Época provável (não lembro bem): janeiro de 1972 (?).

Um tiroteio num campo de futebol lotado, apenas dois atingidos, o Jeová e um militar (alguns só arranhados, de raspão e por estilhaços de ricochete).

Nunca poderíamos imaginar que Jeová reagisse, sacando uma arma de fogo nu local cheio de gente; seria mais lógico ele aproveitar a confusão para fugir, como o resto do bando fez. Sacou a arma, feriu um militar e foi atingido mortalmente.

Eu levei apenas um violento safanão do Jeová, que tinha 1.90 m e uns cem quilos de peso (achei que podia imobilizá-lo com a ajuda do JPeter), enquanto outro agente imobilizava outro terrorista. Desvencilhando-se com um forte safanão, ao procurar sacar a arma, Jeová foi atingido por um dos elementos da equipe. O outro não reagiu, foi preso.

Há reportagem com foto da época (publicada dois ou três dias depois do incidente), num grande jornal (Globo, Correio Braziliense?), aparecendo o corpo de jeová no chão, em primeiro plano, com Boanerges acocorado do lado, tentando escutar o que Jeová queria falar.

O Arnos Preis foi eliminado na mesma área (ao longo da Belém-Brasília, em Paraíso, uma vila na época). Conseguiu matar, à traição, dois militares, um morreu na hora; outro, dias depois. A população ficou revoltada e ajudou na caçada. Acuado num matagal às margens da rodovia, não se entregou e foi alvejado quando corria. Foram utilizados faróis de caminhões postados convenientemente na estrada para poder vigiá-lo de modo a evitar a fuga. Foi alvejado de madrugada, quando corria, na tentativa de fuga.

Outra missão, numa fazenda na PA - 70 (que liga Imperatriz a Marabá), quase chegando à margem do Tocantins em frente à Marabá, para prender dois elementos do Molipo, cujos nomes não lembro. Quando chegamos lá, o delegado Fleury já tinha cumprido a missão  e levado os dois bandidos para São Paulo de avião. Nunca compreendi esta missão; perdemos tempo inexplicavelmente. Por que duas equipes para cumprir a uma mesma missão?

Ao todo. foram "dedurados" vinte e três componentes do "grupo da ilha", ao retornarem de Cuba, a maioria eliminada (presa ou morta) devido à traição de um deles. Os que não reagiram foram presos e estão por aí tranquilamente. Quem terá sido o tal traidor, o informante? Muitos dos sobreviventes fizeram declarações de arrepiar, principalmente o Jeová, antes de morrer, e o Boanerges, que na época usava carteira de trabalho coo Antonio Martins, enfermeiro (na realidade era médico), até hoje apareceu para desmascarar o traidor.

Após o incidente no campo de futebol de Guaraí com o Jeová, conseguimos um guia que sabia onde estavam os demais do bando e partimos em sua perseguição. Otávio Ângelo, Sérgio Capozi, Jane Vanini e um outro elemento escaparam do cerco porque eu não quis colocar em risco a vida do filho do guia, menor, que estava inocentemente com os bandidos. Como eles não se entregavam, iria haver tiroteio na certa. Estavam com o Jeová pouco antes de o encontrarmos no campo de futebol. O bando planejava explodir todos os postos de combustíveis ao longo da estrada, até Belém, levando o caos à extensa região devido à interrupção do abastecimento, que iria repercurtir em toda a região Norte, até Manaus.

A volumosa documentação da série de ações anti-Molipo não deve ter sido destruída, por não serem referentes ao Araguaia. Meu relatório de final de missão deve estar lá arquivado, com o nome do suposto traidor declarado por Jeová. Além disso os arquivos dos outros ministérios estão disponíveis, para o caso de se desejar realmente saber o nome do traidor. Os serviços de de informações eram integrados, principalmente odo Ministério das Relações Exteriores, onde está a chave do problema. 

O Boanerges apenas auxiliava o Jeová nas declarações, pois ele falava com muita dificuldade.

Coisas importantes acontecem, ou deixam de acontecer, até hoje em função desse assunto... Qual será o motivo por que os arquivos das Forças Armadas não são abertos, sem restrições nem pré-exame dos asseclas da quadrilha, pelo menos aos historiadores, como informação ou reconstituição história?E o mais importante, por que os arquivos do Ministério das Relações Exteriores não são nem cogitados?

Colocaram a culpa no Cabo Anselmo, mas ele não tinha cacife, nível de conhecimento e de influência suficientes para dedurar com tanta precisão os embarques de volta... e outros detalhes importantes que muitos sabem, da mesma forma que o Jeová sabia ou desconfiava.

Houve um caso de um deles que foi notável: o sujeito, ao saber que ia voltar para o Brasil, escreveu uma minúscula "cola" com todos os endereços dos contatos e a enrolou junto com o filme de sua máquina fotográfica. Ao ser preso em Salvador, o Delegado foi diretamente na máquina, desenrolou o filme e retirou a cola. Nem ao menos despistou, foi direto, sem querer saber de mais nada. Esse indivíduo foi preso, cumpriu pena e contou o ocorrido para todos os companheiros. Inúmeros outros casos flagrantes, semelhantes, aconteceram depois. Na verdade, sem sofismas, um traidor de alto gabarito dedurou os próprios companheiros. Como?

Muito fácil. Um diplomata, ou similar, comunicava, por intermédio do serviço de informações do Ministério das Relações Exteriores, todos os lances  a partir de Cuba. Um Coronel do CIE/Rio ( que ainda está vivo), era o oficial de ligação com o Itamaraty. Logicamente, o Oficial de Ligação do CIE/Rio tinha um Major de auxiliar e substituto eventual (que,igualmente, ainda está vivo). O Coronel está muito doente e não deve durar muito.

O caso do Cabo Anselmo é muito semelhante ao de Manoel Jover Teles...

Depois do lamentável e violento incidente em que prendemos o Jeová e o Boanerges, no campo de futebol em Guaraí, fomos até a pensão onde eles (no total de 6) estavam hospedados e revistamos as bagagens. Munição de revolver e bombas de fabricação caseira, empregando latas vazias de óleo Singer, cheias de pólvora negra, enroladas com arame de aço (para estilhaçar) e cordão de pólvora (estopim).

Jeová ferido gravemente e o Boanerges ileso, uma vez que não ofereceu resistência, foram transportados para a farmácia e medicados, ficando o Jeová deitado num lençol estendido no chão. O nosso elemento ferido foi mandado, na segunda viatura, para o Quartel da PM em Araguaína (tiro no tórax).

O Jeová parecia morto. Deixamos dois soldados PM de guarda e iniciamos a perseguição aos demais elementos do bando, tendo um guia local quenos conduziria ``a fazenda onde sabia que eles estavam. Ao chegarmos próximo, após uma longa caminhada na mata, no planejamento da ação de ataque, o guia informou que o filho, rapaz de de 18 anos, estava com eles. Decidi aliviar a missão, pois eles iriam usar, na certa, o garoto como escudo, como era normal no procedimento deles e eu estava com vários elementos novos na equipe, que poderiam atirar, a não ser com risco de vida, defesa própria. Só intimidar. Se fraquejassem, apenas os antigos da equipe poderiam agir. Como eu já previa, eles fugiram, levando o rapaz de refém, como escudo, com uma arma na cabeça,sem chance para nós. Deixaram os "trouxas" para trás...

Frustração grande nossa; deixamos de prendê-los, lamentavelmente. Eram quatro, embora a ordem do CIE se referisse a apenas três, além de Jeová e Boanerges: Otávio Ângelo, Jane Vanini, Sérgio Capozi (o quarto elemento, não foi identificado, talvez Rui Berbert).

Retornamos a Guaraí à tardinha, quando o Jeová, para minha surpresa, pois achávamos que estava morto, pediu para falar com o chefe da equipe. O Boanerges ainda estava muito nervoso, mas auxiliou e falou, mais interpretando do que falando o que o Jeová balbuciava com dificuldade. O Jeová morreu em seguida, à noite, e o passamos juntamente com sua longa ficha criminal, ao prefeito, que mandou sepultá-lo no cemitério local. O Jeová falou sobre terem sido dedurados, revelando o nome do traidor. Escutamos pacientemente e tudo foi anotado. Não dei grande valor ao que ele disse, mas depois de analisarmos todos os fatos, nos impressionaram a exatidão e o cOnteúdo das ordens que recebemos em Brasília: eram de uma precisão fantástica. Eles iriam se reunir em Guaraí entre tais dias, nomes de todos eles fotos, fichas, etc. Trabalho digno de Scotland Yard... Fizemos um relatório pormenorizado da operação ao CIE/ADF, na volta. Em seguida, de Guaraí prosseguimos para Araguaína, preocupados com a saúde do elemento de nossa equipe ferido. Como sempre, o nosso procedimento era, como eu dizia "feito cantiga de grilo", só parávamos após cumprida a missão. Muitos queriam comer alguma coisa, mas "comiam mesmo era poeira"... 

Em Araguaína, entregamos o preso ao Cmt do Btl da PM e passamos a relatar resumidamente as operações ao Capitão Chefe da 2ª Seção, Informações, após visita ao nosso elemento ferido, fora de perigo, na Enfermaria. Nos hospedamos numa pensão e iniciamos incursões de reconhecimento pela cidade. O resto do bando poderia estar por lá. No dia seguinte,na hora do almoço, o Cap S2 PM* nos procurou, informando que tinha um casal suspeito num determinado hotel. Montamos uma paquera e suspeitei que a moça era a Jane Vanini, pois as características coincidiam com a foto: bonita,cabelos pretos, longos e lisos, olhos escuros, altura, etc.; o marido tinha viajado para Marabá. Com a participação do gerente do hotel e na presença do Cap PM, revistamos o quarto da moça, enquanto ela se explicava  ao gerente na portaria do hotel (estavam devendo várias semanas ao hotel). Encontramos no quarto ua foto de guerrilheiros cubanos (pela placa do carro que aparecia), armados de fuzis e revólveres, posando de revolucionários. Mandamos vir a moça, que ficou revoltada com a invasão e explicou que era uma foto recebida de uma amiga. Aceitamos o que ela disse e a levamos à presença do marido em marabá, mas antes passamos numa serraria onde ela informou que ele trabalhava na administração. Revistei a mala dele , tendo encontrado uma intimação judicial por abandono de família (mulher e filha). Guardei no bornal e prosseguimos para Marabá. A moça chorou o tempo todo da viagem, umas três horas. Em Marabá, convidei o marido dela, que localizamos facilmente num bar, para nos acompanhar e fomos para a delegacia policial. Depois de interrogá-lo, concluí que o casal nada tinha com os bandidos. Mostrei, então, a intimação judicial e eles abriram em choro convulsivo. Estavam desesperados. Pensaram que iriam ser presos e recambiados para São Paulo à presença do Juiz. Deixeios a sós por meia hora e libertei-os. Era pista fria, gelada.

Cerca de um ano depois, voltei a encontrar esse casal em Xambioá, num barco que ia para a Fazenda Santa Isabel, subindo o rio Araguaia. Os moradores denunciaram que estava cheio de armas, com muitos "paulistas". Nada de suspeito foi encontrado e eles foram libertados.

Muito trabalho desenvolvido no período, numa extensão enorme do nosso território.

As missões ao longo da Belém-Brasília eram descobrir indícios da "grande área" de treinamento de guerrilha, mas demos de cara com o "grupo da ilha", livrando a área de muitos atentados. Este fato nos atrasou demais nas pesquisas das áreas que tínhamos planejado: Tocantinópolis/Porto Franco,Xambioá e Marabá. Mas, como estamos vendo, foi providencial. O Molipo foi neutralizado nas cidades e no campo e o grande herói foi o "dedo-duro"...


A descoberta da grande área


Pedro Albuquerque Neto ("Jesuíno"), preso pela Polícia Federal em Fortaleza, Ce, por vagabundagem (sem documentos), declarou ter fugido de um campo de treinamento de guerrilha localizado no sudeste do Pará. A verdade, declarou ele, é que sua mulher, Tereza Cristina (Ana), engravidou e eles receberam ordem para fazer o aborto. Inconformada, ela resolveu desertar e os dois realizaram a fuga juntos para Fortaleza, onde foram presos pela Polícia. Prestaram declaração e foram recolhidos ao xadrez. Arrependidos de ter falado e principalmente por saber que seria justiçado pelos companheiros (como declarou posteriormente), tentou o suicídio, cortando os pulsos com uma lâmina de barbear. Foi salvo pela sentinela e levado para o hospital da Guarnição do Exército.

Por sorte, o depoimento do Pedro Albuquerque foi remetido diretamente ao CIE/ADF, Brasília, senão teria sido engavetado no Rio de Janeiro (trâmites legais), onde o assunto guerrilha rural era motivo de chacota. Caiu nas mãos do General Bandeira. Foi providenciado o transporte imediato do preso para Brasília, onde foi novamente interrogado, quando acrescentou outros dados (detalhes sobre o local, efetivo, armamento, nomes dos componentes e outros). Perguntado qual o efetivo em pessoal lá existente, revelou que eram muitos, da ordem de trinta, num só destacamento.

Sobre a localização da área, informou que indo de Xambioá, subindo o rio Araguaia até a picada de Pará da Lama, indo até o útimo morador, o campo de treinamento ficava além, a menos de seis horas de caminhada por uma picada.

Foi montada a operação de busca de informações, chefiada pelo Coronel Sérgio Carlos Torres, Chefe da Seção de Operações do CIE/ADF e eu no comando da equipe de busca, efetivo de dez homens da Brigada de Infantaria. Fomos de C47 da FAB até Araguaína e de caminhão da Rodobras até Xambioá. Nessa viagem, desde Brasília, O Coronel Raul Augusto Borges, Chefe da 2ª Seção/8ª RM, nos acompanhou, tendo permanecido alguns dias em Xambioá.

A grande área presumida foi bloqueada por tropa da 8ªRM nos principais pontos da Trans-Amazônica (Marabá) e Belém-Brasília, Araguaína e Imperatriz.

A partir de Xambioá, subindo o rio Araguaia até Pará da Lama, antes da primeira correfeira, um dia inteiro de marcha firme pela trilha no sentido do Xingu. Partimos ainda escuro, dia 11 de abril de 1972. Já noite, chegamos até a casa do último morador, Sr. Antônio Pereira. Fomos bem recebidos pela humilde família, comemos frango com arroz, conversávamos um pouco e fomos pouco a pouco saindo para armar a rede e dormir. 

Na madrugada seguinte foi iniciada a marcha até os "paulistas" , indo o filho mais novo do Antônio como guia, fato que não pude evitar devido à insistência do Antônio Pereira.

Cerca do meio-dia, são avistados dois homens sem camisa sentados em tocos, no pátio de uma palhoça, e uma velha, conversando, descansando para o almoço.

Os cachorros da casa começaram a latir e iniciamos a corrida para onde eles estavam. Conseguiram fugir para a mata, pois havia sido preparado um obstáculo entre a picada e as casas: eles aproveitaram um leito de rio seco, cheio de troncos que tornaram pontiagudos, a guisa de abatises, retardando a nossa aproximação. Quando chegamos na casa, os comunistas tinham fugido, deixando o almoço no fogo, quase pronto, uma panela de frango, outra de de arroz e muita farofa. Dividida pelos do nosso grupo,não deu para matar a fome, mas foi muito bom.

Foi encontrada uma grande quantidade de documentos e manuais de treinamento militar, livros de doutrinação comunista, grande quantidade de uniformes, mochilas de lona reforçadas e costuradas com linha grossa , máquina de costura frande, industrial, armamento e munição, oficina de rádio bem aparelhada, com os instrumentos básicos para transmissão e recepção (geradores de sinais da freqüência de HF e VHF, medidores, etc.), ferro de soldar, grande quantidade de instrumentos cirúrgicos de alta qualidade (tudo inox),grande estoque de remédios os mais diversos, grande quantidade de bússolas portáteis ainda nas caixas, facões e facas, grande estoque de sacas de arroz em casaca, sacas de feijão, sacas de milho debulhado, grandes plantações de macaxeira, jerimum, melancia, maracujá, melão, laranjas, limão criação de galinhas em cercados rústicos de paus, porcos e animais silvestres aprisionados em chiqueiros, etc. Procuramos a casa do gerador de energia e não encontramos.

Estava,assim, a 12/04/1972, descoberta a "grande área" de treinamento de guerrilha citada por Marighela.

Estávamos satisfeitos; afinal, após um grande esforço, tínhamos cumprido com êxito a missão recebida. O meu único desgosto foi que conseguiram fugir nas nossas barbas. Sem dúvida alguma, os pegaríamos depois.

Destruímos tudo depois de separar amostras de documentos e algumas provas numa mala. Ateamos fogo nas casas e galpões e destruímos o estoque de frutas num belo tiroteio. Aguardamos o fogo baixar e fomos para a picada. Aí demos por falta da mala com as provas que denunciassem a presença de guerrilheiros na área.

A esse respeito, o Cid declarou:

"Estávamos eufóricos, Comprovamos a existência da famosa "grande área" anunciada por Marighela que estaria sendo preparada desde 1962. A adrenalina e a euforia nos impediam de pegarmos no sono. Todos nós estávamos conscientes de que o que tínhamos descoberto era algo muito grande e muito organizado.Mas, a grande caçada mesmo, só começaria meses depois".

A equipe retornou a Xambioá, tendo sido o relatório transmitido para o CIE/ADF por fonia via São Paulo pela estação de rádio de uma serraria em São Geraldo.

No dia seguinte bem cedo, tomei café e fui para a margem do rio onde fiquei admirando a paisagem. O Araguaia é o rio mais bonito da região, talvez 
só suplantado pelo Tapajós.
O cabo Marra, da PM do Pará em São Geraldo, em frente a Xambioá, lado do Pará, vindo de canoa em companhia de um morador, Zé Caboco, apresentou-se amim informando que o morador se prontificava anos levar até a casa de Dina, que era sua vizinha. Alguns moradores locais, curiosos, se aproximaram e um deles, piloto de avião monomotor Pedro Careca, informou que poderia nos levar até o castanhal da Viúva, cujo capataz, Sr. Victor, nos indicaria o caminho.

Fui falar ao Coronel Torres na pensão e ele me recomendou não ir sozinho. Fui ao "alojamento" (um quarto grande da pensão com várias camas) e não encontrei Cid e, como não havia tempo a perder, escalei o João Pedro. Quando íamos saindo para a pista de pouso, aparece o Cid, que fica inconformado. Então, combinei com Pedro Careca levar os 4 sem bagagem (o avião cabia 3 mais a bagagem num compartimento incômodo atrás do banco traseiro).

Quando chegamos lá, dia 17/04/1972, equipe de 4 homens mais o Zé Caboco, o grupo de dina já estava preparando a fuga, reunidos numa das casas, avisados que foram pelos três elementos que fugiram anteriormente à nossa aproximação. Estávamos com muito pouca munição, apenas as das  armas e alguns cartuchos nos bolsos. Eles eram cerca de dezoito pessoas do grupamento C, o mais ao sul da área, sendo 4 mulheres, conforme informação do morador da casa onde paramos. Contada a munição disponível, decidi: "Eles são 18, menos 4 mulheres, acho que dá para enfrentá-los". O morador retrucou: "Doutor, as mulheres são piores que os homens". E contou alguns episódios que assistiu, em que as mulheres fustigavam os homens, chamando-os de frouxos e outras coisas mais. Fiquei no dilema, mas logo decidi voltar para pegar reforço. Apagamos os nossos vestígios e voltamos.

Em Xambioá, Pegamos o helicóptero de uma mineradora e voltamos no dia seguinte para a área, com bastante munição. Éramos ao todo 6 homens, carga máxima do helicóptero.

O piloto não queria baixar. Aproveitando uma tentativa que fez , baixando até o limite que considerou seguro, joguei um cunhete de munição e saltei atrás, capinando com o facão os arbustos que ele dissera que estavam atrapalhando o pouso.

O cabo Marra e tr~es soldados da PM se juntaram à nossa equipe; tinham marchado a noite toda até lá. Os fugitivos estavam muito carregados, demonstrado pelas pegadas profundas na lama.

Iniciamos a perseguição através da mata, seguindo-lhes facilmente por cima das pegadas. Não havia dúvida, iríamos pegá-los logo mais. Devia ser meio-dia, mata fechada, continuávamos nos adiantando  e chegávamos a ver os "olheiros" de longe, fugindo para aos demais do grupo que estávamos nos aproximando. 

Foi quando sentimos a aproximação de alguém vindo por uma trilha que estávamos ultrapassando. Um indivíduo de mochila às costas, chapéu de vaqueiro, revólver 38 e facão na cintura, marchando pela trilha. Estávamos escondidos no mato e ele ia passando quase marchando. "Pega esse cara aí", gritei. O nosso elemento mais próximo, o Cid, correu e o pegou, passando-lhe a algema de plástico. O cara declarou chamar-se Geraldo e que era morador antigo da região. Foi detido como suspeito , desarmado, e deixado algemado com o cabo Marra e soldados da PM enquanto reiniciávamos a perseguição. 

Pressentimos o avanço firme da nossa equipe, os fugitivos desviaram a rota e esconderam quase toda a pesada carga que transportavam, passando a progredir mais rápido, bons conhecedores que eram da área. Encontramos facilmente essa carga escondida e a destruímos à facão, quando escutamos três tiros de fuzil vindos de onde tínhamos deixado o Cabo Marra com Geraldo. O Zé Caboco me disse: "Agora ficou difícil pegá-los. Eles estão indo para a Gameleira". Com já estivesse escurecendo e chovendo torrencialmente, dificultando a perseguição, mascarando as pegadas, resolvi voltar. Iríamos encontrá-los mais adiante, mais uma vez, vaticinei com muita contrariedade. Era o segundo "fracasso", tendo que deixá-los escapar nos nossas barbas... Além disso, era muita falta de sorte, prender um suspeito em plena selva e logo em seguida soldados inexperientes matá-lo, pensei; eu estava realmente preocupado, pois aquele suspeito poderia informar muita coisa.

O Geraldo, mesmo algemado e com uma pesada mochila nas costas, tinha disparado numa desabalada carreira pela mata, tentando fugir, quando foram dados três tiros de advertência. Foi novamente preso e ficou amarrado num tronco. Com a chegada estava visivelmente apavorado. Procuramos abrigo num mocambo de palha e o Geraldo tenta explicar falando fluentemente que era morador da área e tinha tentado fugir porque estava assustado com tanta gente armada na mata.

Nada tendo sido achado de anormal em sua mochila, já estava para ser liberado. Resolvi, porém, conversar com o Geraldo, fazer pessoalmente uma nova vistoria na mochila. Alguma coisa não estava muito clara na história que contava; era muito loquaz, repetindo com sofreguidão os mesmos argumentos, demonstrando ansiedade acima do normal. Tinha treinado o álibi, naturalmente e, naquela situação, não era capaz de disfarçar. Foi a conta. Achei um tubo de alumínio, de pastilhas de remédio, contendo linhas finas de pesca e anzóis diminutos, típico material de sobrevivência. Ao perguntar alguns detalhes ao Geraldo, noteique ele estava pálido e assustado. Retirado todo o material de pesca do tubo, avistei no fundo um papel pautado de caderneta. Era a mensagem do B para o C, el linguajar miitar. Mensagem manuscrita a lápis, de Osvaldão, comandante do grupamento B da Gameleira para Antônio da Dina, comandante do grupamento C.

    "C - Aqui tudo bem. Exército atuando na área com efetivo de 1 Cia - B"

Geraldo, perante tamanha evidência, desmoronou, não teve alternativa e começou a falar, responder às perguntas que lhe eram feitas, ansioso para demonstrar que agora estava falando a verdade. Os elementos de minha equipe estavam realmente indignados. Muitas de suas informações batiam com as de Pedro Albuquerque, que ele não sabia que fora preso. No verso de um papel de um pacote de cigarro, o Cid anotava tudo com um toco de lápis surgido não se sabe de onde. O João Pedro do lado,tentando segurar a verborragia do Geraldo, agora declarado José José Genoíno, natural do Ceará e membro do grupamento B da Gameleira, cujo comandante era o Osvaldão, cujo chefão era Maurício Grabois, que se reportava a João Amazonas, e lá vai tudo o mais... Levantei-me e fui beber um pouco d'água no córrego próximo.Realmente, eu estava muito satisfeito. O preso era, sem sombra de dúvida, pelo conhecimento da organização da guerrilha e conhecimento dos nomes dos chefões, elemento importante. Era "gente fina", enquanto Pedro Abuquerque era "pica-fumo".

Cada vez mais aumentavam as nossas surpresas. Era, no entanto, a extremidade sul da "grande área".

No dia seguinte bem cedo, como combinado, o pequeno helicóptero de uma mineradora, vindo para o mesmo local onde desembarcamos, entreguei o "Geraldo" ao Major Othon Cobra no helicóptero, que retornou a Xambioá. Genoíno posteriormente, foi levado para Brasília, onde foi interrogado. Tratava-se de conhecido militante do PC do B, ativista antigo, baderneiro estudantil.

Conclusão: José Genoíno Neto foi o primeiro preso na mata, no dia 18/04/1972. A partir daí, todos os argumentos contrários foram varridos: eles estavam lá há muito tempo.

Graças aos militares, Genoíno foi colocado no bom caminho, após cumprir um curto período de prisão, sendo-lhe facultado pautar pautar por vida honesta. Infelizmente, não aproveitou tal oportunidade.

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E assim, foi como se sucedeu a prisão de José Genoíno Neto: sem agressões, sem tortura, sem nenhum tipo de tratamento indigno como ele contou, muitos anos depois, no intuito de se beneficiar com as generosas quantias de uma indenização imoral e descabida, proporcionada por Fernando Henrique Cardozo e seus ardilosos ministros. Seria infantil e desnecessário a prática de tortura ou procedimento mais rude, quando, de bom grado o prisioneiro abriu a boca quando se viu desmascarado pelo Cel Lício Maciel. Este militar é considerado um dos homens mais honrados da Força Terrestre, dentre aqueles que atuaram na Guerrilha do Araguaia, e não temos razão nenhuma para duvidar de sua palavra.
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Triste notícia veio depois. Dois bandidos perseguiram e assassinaram a facão o filho de Antonio Pereira, apenas  por ele ter nos acompanhado poucas horas na mata. Trucidaram o pobres rapaz, decepando sucessivamente orelhas, dedos, etc. na frente da família indefesa, até o golpe final. Destruíram uma família honesta, simples moradores afastados do mundo, no interior da mata. Tiveram que se mudar para Xambioá e a família foi se deteriorando, acabando, morrendo de desgosto. Nunca foi dada pelos bandidos uma nota de arrependimento, um pedido de desculpas à família do Antonio Pereira. Pelo contrário, encobrem o assassinato frio e perverso. Hoje distorcem a verdade dos fatos, são irrecuperáveis. Agora, na expectativa de uns trocados, os moradores, eles próprios, distorcem os fatos a gosto dos inquiridores.

Pedro Albuquerque (Jesuíno) e José Genoíno (Geraldo), dizem hoje que foram torturados.

Primeiro, Pedro Albuquerque já tinha dado o "mapa da mina", não havia motivo para torturá-lo. Confessou que tentara o suicídio por medo do justiçamento, pois conhecia bem os companheiros. Ponderei ao Gen. Bandeira que não havia necessidade de levá-lo na minha equipe, mas o General deu a ordem: Leva o cara. Fez um passeio pela mata, em quase três dias, completamente solto, livre, cumprimentado por alguns moradores, não tentou fugir. nem mesmo guarda foi estabelecida, pois não acreditávamos no perigo do "inimigo"

Quanto a Geraldo, talvez a "tortura" a que ele se refere a companhia de gente carrancuda e armada numa remota área desolada da Amazônia, como ele mesmo alegou para o fato de ter tentado a fuga.Principalmente depois de lida a rudimentar mensagem que portava, que qualquer escoteiro teria decorado. Não havia motivo, portanto, para torturá-lo. Falou apavorado, sem levar sequer um safanão. E está vivo como estamos vendo...

Quanto à mentira que dizem que nós já chegávamos atirando, quando encontramos os três, dois homens e uma velha (já esclarecido como sendo Oneide e supostamente com  marido, O Alfredo, e outro não identificado), poderíamos acertá-los facilmente com tiros de FAL, mas nem passou pela nossa cabeça tal procedimento, pois nem tínhamos certeza de serem comprovadamente os "paulistas" que procurávamos. Mesmo que tivéssemos certeza de que eram bandidos, teríamos que pegá-los vivos para interrogatório, a não ser que reagissem de arma na mão.

Esta é a verdadeira história da descoberta da "grande área de treinamento de guerrilha" de Marighela: levada por Pedro Albuquerque, uma equipe de CIE/ADF destruiu, em 12/04/1972, um ponto de apoio de grupamento C, comandado Antonio de Dina (Antonio Carlos Monteiro Teixeira) e, no prosseguimento, em 18/04/1972, prendeu na mesma área o guerrilheiro "Geraldo" (José Genoíno Neto), que descreveu toda a organização, o efetivo em pessoal e a localização no terreno de toda a guerrilha e tudo o mais.

Diz o Coronel Madruga: 

"Embora alguns atribuam a descoberta a uma possível indiscrição de Lúcia Regina de Souza Martins, guerrilheira que abandonou a área por estar doente, isto não é verdade. Na realidade o conhecimento da área deveu-se ao fato da detenção em fevereiro de 1972,pelo Departamento de Polícia Federal, de uma casal de estudantes bastante comprometido com a agitação no Movimento Estudantil, que se encontrava desaparecido e que havia retornado a Fortaleza.Tratava-se de Pedro Albuquerque Neto e Tereza Cristina ("Ana")."

Daí em diante, foi um suceder de fatos inexoráveis.




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No próximo capítulo ( 7º ) os combates com o grupo militar da guerrilha e com o grupamento A; mortes de Osvaldão, André Grabois e demais chefes, inclusive do principal deles Maurício Grabois, e publicação de seu diário.

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