20 de fevereiro de 2013, em Opinião, Política Externa, por Guilherme Poggio
Há uma verdade profunda e desconfortável: o ambiente devido à Guerra do Iraque foi benéfico para o Brasil
Matias Spektor
A Guerra do Iraque completa dez anos, deixando mais de meio milhão de mortos e um país devastado.
É impossível contar essa história sem ser tomado por um sentimento de revolta.
Afinal, as forças de ocupação, atuando sem autorização clara das Nações Unidas, foram campeãs de incompetência.
Destituíram as Forças Armadas do país, empurrando seus homens para a resistência. Privatizaram de modo ineficiente os serviços públicos, dificultando o processo de reconstrução no pós-guerra. Impuseram um regime que aos olhos de muitos é ilegítimo.
De quebra, mentiram, enganaram e torturaram, repugnâncias que não impedem a George W. Bush e Tony Blair viver hoje em liberdade.
Qual o impacto da guerra sobre a política externa brasileira?
Com a perspectiva de dez anos, agora é possível evitar a resposta mais superficial, segundo a qual o conflito teria sido nefasto para o Brasil porque esgarçou o direito internacional e, a um custo de quase US$ 3 trilhões, contribuiu para o desequilíbrio econômico do planeta.
Há uma verdade mais profunda e menos confortável: o ambiente internacional criado pela Guerra do Iraque foi benéfico ao Brasil.
Três dinâmicas merecem destaque. Primeiro, a guerra provocou uma avalanche de protestos em todo o planeta, legitimando a mensagem central da diplomacia brasileira -como o mundo ainda apresenta resquícios do velho sistema imperial, é urgente democratizar a gestão das relações internacionais. Essa demanda por alternativas foi precondição para que Lula se transformasse em ícone global.
Segundo, a guerra criou um forte incentivo para que os Estados Unidos promovessem o ativismo brasileiro na América do Sul.
O vasto leque de iniciativas brasileiras de integração regional não apenas recebeu o beneplácito de Washington, mas também seu apoio explícito. Para a Casa Branca de Bush, um Brasil ativista poderia reduzir custos, liberando recursos escassos para o trabalho no Oriente Médio.
Terceiro, a guerra pôs Índia e Turquia no mapa. Embora não tivesse o mesmo valor geopolítico, o Brasil beneficiou-se por tabela depois que Bush criou novos procedimentos diplomáticos para se relacionar com as “novas potências emergentes”. Obteve fôlego a crença em que países como o Brasil mereciam deferências especiais e doses crescentes de atenção.
O Brasil ganhou porque foi pragmático. Junto ao resto do mundo, ouviu de Bush que “toda nação tem uma escolha para fazer neste conflito [...] não há território neutro”.
Lula fez a sua. “Presidente, entendo sua posição”, disse ao colega na Casa Branca. “Mas minha guerra é outra.”
Em vez de ficar contrariado, o presidente americano ficou admirado. “Gosto desse cara”, comentou com assessores depois do encontro. “Ele vai fazer negócio comigo”. E fez.
Em política internacional termina-se sempre com o estômago embrulhado. Aqui não é diferente. Horrorosa como foi, a Guerra do Iraque moldou o contexto da ascensão brasileira, com tudo o que nela há de real e de imaginário.
FONTE: folha.com
FONTE: folha.com
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