Levantamento feito pelo 'Estado' mostra que a petroleira de Eike fez 105 comunicados ao mercado em dois anos e meio, grande parte deles anunciando descobertas em um mesmo poço
07 de julho de 2013 | 2h 08
rany Tereza e Mariana Durão - O Estado de S.Paulo
RIO - Em uma campanha exploratória impressionante a OGX
protagonizou, em dois anos e meio - de outubro de 2009 a maio de 2012 -,
55 anúncios de descoberta de petróleo ou declarações de comercialidade
(jargão que indica, no setor de petróleo, que uma área pesquisada vai
virar um campo produtor). A cada comunicado promissor, o mercado reagia
imediatamente e a empresa acompanhava os saltos no gráfico de suas
ações.
A despeito disso, as ações subiam sempre que um desses "fatos relevantes", como são conhecidos os relatórios oficiais, era enviado à Bolsa de Valores e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM, responsável pela fiscalização de mercado).
Agora, o mercado financeiro parece dividido entre alternativas ruins: houve incompetência, ingenuidade ou má gestão? "Não é plausível que uma empresa com tantas promessas de sucesso tenha se tornado um fracasso da noite para o dia", diz Ricardo Lacerda, sócio do banco BR Partners.
Alguns comunicados tinham tom eufórico. "A OGX é a prova de que vale a pena apostar na competência dos brasileiros e na riqueza e abundância dos nossos recursos naturais. Esses recentes sucessos vão pavimentar o caminho do nosso robusto crescimento e igualdade social. Viva o Brasil!", escreveu Eike em outubro de 2009, no fato relevante enviado à CVM sobre a descoberta no bloco marítimo da Bacia de Campos BM-C-43.
Até junho de 2012, quando teve de revelar o real volume do petróleo que jorrava de sua principal aposta, o campo de Tubarão Azul, na Bacia de Campos - um décimo do que apregoou -, o tom das informações que vinham da OGX era exatamente esse. Em janeiro de 2010, poucos meses depois de começar a furar os poços, Eike fez uma previsão mais do que otimista num documento ao mercado: "Com os resultados de nossas perfurações até o presente, fomos capazes de revelar uma nova província no sul da Bacia de Campos e quebrar paradigmas (...). Agora nos preparamos para uma nova fase na história da OGX, que buscará atingir a produção de 1,4 milhão de barris por dia em 2019". Ou seja, previa, em dez anos, alcançar o resultado que a Petrobrás obteve somente depois de cinco décadas.
Há uma semana, jogou a toalha: a produção em Tubarão Azul deve cessar em 2014, dois anos após retirado o primeiro óleo. Outros três campos foram suspensos três meses após a declaração de comercialidade. A OGX invalidou as projeções divulgadas anteriormente.
Segundo fontes, a CVM agora vai olhar para trás e investigar o "conjunto da obra" da OGX. Vai analisar com lupa todos os fatos relevantes, em especial os que continham projeções, para averiguar se foram elaboradas sem diligência ou de forma a confundir o investidor. A avaliação poderá respingar não só nos atuais executivos, mas em todo o grupo de estrelas do setor contratado a peso de ouro.
Em abril de 2010, por exemplo, a CVM exigiu da OGX esclarecimentos sobre um volume atípico de movimentação das ações. Nessa época, apenas quatro meses depois de passar a integrar o índice Bovespa, a empresa fizera seis comunicados de "presença de hidrocarbonetos" (indícios de petróleo) nos mesmos dois blocos (BMC-41 e BMC-42) da Bacia de Campos. O BMC-41 deu origem ao prospecto de Waimea, que virou o campo de Tubarão Azul.
A OGX respondeu que a elevação das negociações poderia ter sido por uma avaliação positiva do banco Credit Suisse ou pelos rumores de que estaria em curso a venda de 20% da empresa.
Luiz Felipe Carvalho, analista de petróleo do HSBC, diz que a credibilidade da OGX foi corroída por uma série de eventos. Em fevereiro de 2011, a OGX informava que Waimea continha óleo pesado, de 20º API, que não está nos melhores padrões de comercialização. Mas a vazão seria extraordinária: 40 mil barris por dia. Hoje sabe-se que essa vazão, decrescente, não ultrapassa 5 mil barris diários.
A divulgação de previsões é facultativa, mas segundo as regras da CVM, deve trazer "informações verdadeiras, completas e que não induzam o investidor a erro". "O mais surpreendente é que após ter levantado tanto capital sobraram tão poucos ativos do império X", diz Lacerda, do BR Partners.
A partir de outubro de 2009, quando anunciou sua primeira descoberta, a OGX passou a adotar nos comunicados o aposto: "maior companhia privada brasileira do setor de petróleo e gás natural em termos de área marítima de exploração".
Perplexidade. A queda da OGX provocou perplexidade e dividiu opiniões. No BNDES, um dos principais financiadores de Eike, há quem acredite que o empresário pode ter sido ludibriado, como a maior parte do mercado. "Atuar alavancado cobra seu preço: o preço é que os 'planos de negócio' sejam consistentes, caso contrário...", disse a fonte.
Para alguns, o fato de Eike ter mantido as ações das companhias X pode dificultar uma punição. "Ele está morrendo com o mico-preto na mão", disse um executivo do alto escalão de uma multinacional.
Veja também:
'Ação da família X traz segurança'
Projetos de Eike para o Rio continuam no papel
Efeito OGX afeta fundos indexados ao Ibovespa
Um levantamento de todas as divulgações feitas pela petroleira de
Eike Batista desde sua criação, em 2007, revela que foram mais de 105
comunicados oficiais. Metade deles apontava indícios de petróleo em suas
áreas. Grande parte das descobertas referia-se ao mesmo poço perfurado,
apenas em estágios diferentes.'Ação da família X traz segurança'
Projetos de Eike para o Rio continuam no papel
Efeito OGX afeta fundos indexados ao Ibovespa
A despeito disso, as ações subiam sempre que um desses "fatos relevantes", como são conhecidos os relatórios oficiais, era enviado à Bolsa de Valores e à Comissão de Valores Mobiliários (CVM, responsável pela fiscalização de mercado).
Agora, o mercado financeiro parece dividido entre alternativas ruins: houve incompetência, ingenuidade ou má gestão? "Não é plausível que uma empresa com tantas promessas de sucesso tenha se tornado um fracasso da noite para o dia", diz Ricardo Lacerda, sócio do banco BR Partners.
Alguns comunicados tinham tom eufórico. "A OGX é a prova de que vale a pena apostar na competência dos brasileiros e na riqueza e abundância dos nossos recursos naturais. Esses recentes sucessos vão pavimentar o caminho do nosso robusto crescimento e igualdade social. Viva o Brasil!", escreveu Eike em outubro de 2009, no fato relevante enviado à CVM sobre a descoberta no bloco marítimo da Bacia de Campos BM-C-43.
Até junho de 2012, quando teve de revelar o real volume do petróleo que jorrava de sua principal aposta, o campo de Tubarão Azul, na Bacia de Campos - um décimo do que apregoou -, o tom das informações que vinham da OGX era exatamente esse. Em janeiro de 2010, poucos meses depois de começar a furar os poços, Eike fez uma previsão mais do que otimista num documento ao mercado: "Com os resultados de nossas perfurações até o presente, fomos capazes de revelar uma nova província no sul da Bacia de Campos e quebrar paradigmas (...). Agora nos preparamos para uma nova fase na história da OGX, que buscará atingir a produção de 1,4 milhão de barris por dia em 2019". Ou seja, previa, em dez anos, alcançar o resultado que a Petrobrás obteve somente depois de cinco décadas.
Há uma semana, jogou a toalha: a produção em Tubarão Azul deve cessar em 2014, dois anos após retirado o primeiro óleo. Outros três campos foram suspensos três meses após a declaração de comercialidade. A OGX invalidou as projeções divulgadas anteriormente.
Segundo fontes, a CVM agora vai olhar para trás e investigar o "conjunto da obra" da OGX. Vai analisar com lupa todos os fatos relevantes, em especial os que continham projeções, para averiguar se foram elaboradas sem diligência ou de forma a confundir o investidor. A avaliação poderá respingar não só nos atuais executivos, mas em todo o grupo de estrelas do setor contratado a peso de ouro.
Em abril de 2010, por exemplo, a CVM exigiu da OGX esclarecimentos sobre um volume atípico de movimentação das ações. Nessa época, apenas quatro meses depois de passar a integrar o índice Bovespa, a empresa fizera seis comunicados de "presença de hidrocarbonetos" (indícios de petróleo) nos mesmos dois blocos (BMC-41 e BMC-42) da Bacia de Campos. O BMC-41 deu origem ao prospecto de Waimea, que virou o campo de Tubarão Azul.
A OGX respondeu que a elevação das negociações poderia ter sido por uma avaliação positiva do banco Credit Suisse ou pelos rumores de que estaria em curso a venda de 20% da empresa.
Luiz Felipe Carvalho, analista de petróleo do HSBC, diz que a credibilidade da OGX foi corroída por uma série de eventos. Em fevereiro de 2011, a OGX informava que Waimea continha óleo pesado, de 20º API, que não está nos melhores padrões de comercialização. Mas a vazão seria extraordinária: 40 mil barris por dia. Hoje sabe-se que essa vazão, decrescente, não ultrapassa 5 mil barris diários.
A divulgação de previsões é facultativa, mas segundo as regras da CVM, deve trazer "informações verdadeiras, completas e que não induzam o investidor a erro". "O mais surpreendente é que após ter levantado tanto capital sobraram tão poucos ativos do império X", diz Lacerda, do BR Partners.
A partir de outubro de 2009, quando anunciou sua primeira descoberta, a OGX passou a adotar nos comunicados o aposto: "maior companhia privada brasileira do setor de petróleo e gás natural em termos de área marítima de exploração".
Perplexidade. A queda da OGX provocou perplexidade e dividiu opiniões. No BNDES, um dos principais financiadores de Eike, há quem acredite que o empresário pode ter sido ludibriado, como a maior parte do mercado. "Atuar alavancado cobra seu preço: o preço é que os 'planos de negócio' sejam consistentes, caso contrário...", disse a fonte.
Para alguns, o fato de Eike ter mantido as ações das companhias X pode dificultar uma punição. "Ele está morrendo com o mico-preto na mão", disse um executivo do alto escalão de uma multinacional.
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