Com um terço de seus parlamentares
acusados criminalmente, o Congresso de Renan e Henrique dá sinais de
preferir a imundície ao asseio das normas impostas pela moralidade
pública
Agência Senado
Nossa opinião: no Congresso, cidadãos sob suspeita abusam da paciência de um povo tolerante demais com políticos bandidos
“
chiqueiro (sentido figurado) – casa ou lugar imundo”
Sintomático que o presidente do Senado, José Sarney, tenha proibido a
manifestação contra o senador Renan Calheiros (PMDB-AL), convocada por várias entidades e apoiada pelo
Congresso em Foco.
Os manifestantes pretendiam fazer ontem a lavagem simbólica da rampa
do Senado para expressar a indignação que levou, até o momento em que é
publicado este texto, mais de 250 mil brasileiros a subscrever o
abaixo-assinado contra a volta de Renan à presidência do Senado.
O problema é que limpeza é algo que não combina muito com o
Congresso. Nas últimas duas décadas, ele proporcionou seguidas
demonstrações de afronta aos cidadãos que custeiam suas bilionárias
despesas (perto de R$ 8 bilhões no ano passado): escândalo do orçamento
em 1993, compra de votos para aprovar a emenda da reeleição em 1997,
violação do painel em 2001, mensalão em 2005, sanguessugas em 2006,
farra das passagens e
atos secretos em 2009… a lista é infindável.
Mas sempre pode ser enriquecida, aumentando o tamanho dos golpes contra a cidadania, prova agora o processo em curso de
eleição das Mesas
do Senado e da Câmara. Estamos diante de uma daquelas tristes situações
que nos levam a constatar que, em se tratando do Congresso brasileiro,
sempre é possível piorar.
Exemplar é o caso de
Renan.
Na iminência de receber a maioria folgada de votos dos seus pares, foi
até agora incapaz de esclarecer as denúncias que, seis anos atrás, o
obrigaram a renunciar à presidência do Senado para preservar o mandato
de senador.
Reconduzir Renan ao posto, antes de eliminar todas as dúvidas quanto à
sua conduta, põe sob suspeita todo o Legislativo. Um poder que já
apresenta um gigantesco passivo no que se refere ao “controle interno”
dos seus integrantes e das suas ações. E daí? O Congresso, que tem um
terço de seus
parlamentares às voltas com acusações criminais,
continua a dar sinais de preferir a imundície dos chiqueiros ao asseio
das normas impostas por aquilo que, algo pomposamente, poderíamos chamar
de moralidade pública.
Com menos pompa, poderíamos dizer que se espera atenção a pelo menos
duas normas básicas: não roubar o dinheiro dos contribuintes e
investigar ou colaborar com a investigação de crimes contra a
administração pública, sobretudo quando os acusados forem deputados e
senadores.
Oposta é a regra que prevalece no Congresso. Ali, cidadãos sob
suspeita gozam de proteção oficial, tapinhas solidários nas costas,
carro e despesas pagas pelo erário, e abusam da paciência de um povo que
demonstra excessiva complacência em relação a políticos bandidos.
Desfilam pelos corredores do Legislativo desde
políticos condenados a prisão até a espantosa figura de
Paulo Maluf,
alvo de um mandado da Interpol que lhe impede de pisar em qualquer
outro país do mundo, sem ir imediatamente para a cadeia, mas que pode,
legalmente, ser deputado no Brasil.
A precária mobilização popular, muito aquém do tamanho dos desaforos
que o Parlamento tem metido pela goela abaixo da sociedade, contribui
para o escárnio não ter fim.
Apoiado por todos os grandes partidos, inclusive da oposição, é dado
como favorito na disputa da presidência da Câmara outro político sob
fortes suspeitas, o atual líder peemedebista,
Henrique Eduardo Alves (RN).
Questionados sobre possíveis desvios de conduta, ele e Renan reagem
de modo semelhante. Ignoram a denúncia, ao mesmo tempo em que instruem
adversários a atribuir os graves questionamentos que lhes são feitos a
meros preconceitos contra nordestinos. Esta, aliás, é uma das
imbecilidades preferidas da meia dúzia de militantes pró-Renan que nos
últimos dias tenta infestar este
Congresso em Foco com centenas de comentários, invariavelmente usando nomes falsos e termos ofensivos.
Como não há limites para o abismo moral, o PMDB, outrora valente
combatente da ditadura e hoje confortável abrigo para novos e velhos
suspeitos, prepara-se para eleger como líder outro parlamentar sob
investigação,
Eduardo Cunha (RJ). Também deve explicações à Justiça seu rival na disputa,
Sandro Mabel (GO).
Em comum a Renan, Henrique, Eduardo Cunha e Mabel, a facilidade com
que se aliam aos governos de plantão, sempre multiplicando os
instrumentos a serviço de um tipo de política que, definitivamente, não
cheira bem.
O
Congresso em Foco
sente-se no dever de manifestar perplexidade diante de tudo isso e se
colocar à disposição dos brasileiros que pretendem ver um Congresso
radicalmente diferente. Afinal, fazemos jornalismo na esperança de
contribuir para as coisas mudarem para melhor – não para pior.
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