Heitor Scalambrini Costa
Professor da Universidade Federal de Pernambuco
O setor elétrico está presente na mídia já algum tempo com uma agenda negativa. Apagões, “apaguinhos”, tarifas imódicas, devastação ambiental, construção de grandes hidroelétricas em áreas de proteção ambiental em plena floresta amazônica provocando expulsão de populações indígenas de seus territórios, incentivo a termoelétricas a combustíveis fósseis altamente poluentes, construção de polêmicas usinas nucleares. Estes são alguns de seus malfeitos.
Mais recente é a polêmica causada pela estratégia adotada pelo governo federal para reduzir as tarifas elétricas (Medida Provisória no579).
A politização deste tema tem levado a uma grande discussão entre os analistas, acadêmicos, especialistas e na população em geral. Este recrudescimento de posições divergentes com motivações político-partidária, em nada favorece o objetivo final almejado pelo povo, que é a redução das tarifas elétricas.
Utilizar a renovação das concessões das empresas geradoras e transmissoras, da forma autocrática como foi levada a cabo esta decisão, por um número restrito de “experts” governamentais, acarretou uma rejeição quase que generalizada na sociedade.
O que se verifica nos últimos anos, desde a adoção do modelo mercantil para o setor, foi de lucros extraordinários das geradoras, e principalmente das distribuidoras de energia elétrica. Basta para isso acompanhar os balancetes anuais contábeis destas empresas, mostrando lucros líquidos exorbitantes para a realidade brasileira, e conseqüentemente a divisão de altos dividendos aos controladores, inclusive nas estatais.
São nos contratos draconianos de concessão é que reside o “nó” do problema. No caso das distribuidoras é evidente que algo precisa mudar. Pois são os contratos “juridicamente perfeitos” que garante a Aneel estabelecer reajustes das tarifas que penalizam ano após ano o consumidor. Contratos formulados na época das privatizações, com cláusulas embutidas extremamente favoráveis às empresas, criando assim, um negócio praticamente sem riscos ao adquirente.
No caso das geradoras estatais, por muito tempo se beneficiaram de contratos de concessões em que as tarifas eram estipuladas pelas próprias empresas. A energia gerada chega a ser vendida até 5 vezes mais do que o custo para sua produção, operação, manutenção, e lucros necessários a novos investimentos. Ou seja, se locupletam à custa do consumidor final, e acabaram irradiando estes preços para as tarifas pagas pelo consumidor final.
A participação das empresas transmissoras é mais recente no mercado elétrico. Também seus contratos devem ser revistos.
Não se pode entrar no jogo do “dogma dos contratos”. Como algo imexível, com proteção divina, e que nenhum reles mortal poderá modificá-los. Se os contratos têm prejudicado tanto a população, trazido tanto prejuízo a nação deve-se ter a coragem de negociá-los, modificá-los. E não aceitar o terrorismo feito por alguns beneficiários destes mesmos contratos ultrajantes, que advogam que mexer nos contratos afastaria os investidores estrangeiros, abalaria a credibilidade do país, e assim por diante. Uma ladainha, repetida, e que se têm transformado numa verdade absoluta.
O Brasil é grande e importante no cenário mundial, maduro o suficiente para não aceitar mais contratos que usurpam sua soberania, massacram o povo brasileiro, e inviabilizam a distribuição de renda. Não se pode admitir, que os contratos, contrários aos interesses nacionais, se perpetuem. Sem modificá-los as tarifas continuarão a serem majoradas abusivamente. Logo, é nos contratos que reside o cerne do problema das altas tarifas, que beneficiam alguns, e trazem prejuízos a muitos. Obviamente os encargos e impostos também contribuem, e devem ser reduzidos.
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