terça-feira, 27 de novembro de 2012

Zavascki: pela vontade popular, teríamos pena de morte no País



27 de novembro de 2012  11h54  atualizado às 12h24
FERNANDO DINIZ
Direto de Brasília
Enquanto o Supremo Tribunal Federal (STF) recebe manifestações populares de apoio com o resultado do julgamento do mensalão, o novo ministro da Corte, Teori Zavascki, 64 anos, afirmou nesta terça-feira que os juízes não seguem a vontade do povo, caso contrário haveria pena de morte no País. Discreto e evitando falar do julgamento do escândalo de corrupção que se arrasta há quatro meses, Zavascki disse que o excesso de exposição das decisões atrapalham.
"Se fôssemos levar em conta a vontade popular, nós teríamos aplicado a pena de morte há muito tempo. Para aplicar a lei, o juiz tem o papel de tomar decisões muito impopulares", disse Zavascki em sua primeira entrevista após ser nomeado para o STF. "Eu não faço essa relação entre a vontade popular e a vontade da lei. Quem tem de auferir a vontade do povo são aquelas pessoas eleitas pelo povo. O juiz tem de aplicar as leis legítimas", acrescentou.
O ministro, que deixa o Superior Tribunal de Justiça (STJ) para ocupar a vaga deixada por Cezar Peluso, se disse contrário à transmissão ao vivo dos julgamentos pela TV Justiça, apesar de ser favorável à publicidade das decisões. "Um ponto negativo é justamente o excesso de exposição que às vezes não colabora para um julgamento tranquilo e sereno. Para o meu gosto pessoal, eu acho que não (se deveria transmitir sessões ao vivo). Não sou contra a publicidade dos atos, acho que evidentemente os atos do Poder Judiciário, como todos os atos administrativos, de um modo geral, são públicos", afirmou.
O novo ministro não crê em uma mudança profunda na relação da sociedade com a Justiça após o mensalão. "Claro que um julgamento desse tem repercussão social. Não acredito que a relação do Poder Judiciário vá mudar muito profundamente. As relações entre o Judiciário e a sociedade são de uma visibilidade que vai além da publicidade", disse.
Com posse marcada para a próxima quinta-feira, o ministro natural de Santa Catarina pode chegar ao Supremo após o julgamento do mensalão, caso os ministros concluam a dosimetria das penas de Emerson Pamieri, Roberto Jefferson e João Paulo Cunha. Do contrário, Zavascki não pretende se envolver em discussões sobre o caso. "A regra de participação do juiz em um julgamento que está em andamento é a do regimento interno. Pelo que sei, o Supremo decidiu que nesta fase de fixação de penas participam apenas os ministros que proferiram juízo condenatório", disse.
Questionado sobre a discussão do futuro dos mandatos dos parlamentares condenados no julgamento, o ministro também negou participação. "Isso faz parte da pena. Eu não vou participar do julgamento do mensalão", afirmou. O ministro disse, no entanto, que deverá julgar eventuais embargos ao acórdão do caso, o que só deve ocorrer em 2013.
Zavascki evitou comentar a situação, mas disse ter escrito já um artigo sobre o tema quando integrou o Tribunal Regional Eleitoral do Rio Grande do Sul (TRE-RS). "Eu deferi a tese de que a condenação penal suspende os direitos políticos, mas não suspende necessariamente o mandato", disse.
Papel legislador
Na entrevista, Teori Zavascki comentou também o papel da Justiça em proferir decisões que ainda não foram apreciadas pelo Legislativo. Para o ministro, os juízes não podem deixar de julgar um caso alegando falta ou obscuridade da lei.
"A diferença entre a atividade do juiz e do legislador é que o juiz atua diante de situações concretas, e o legislador, em torno de situações futuras. O legislador, em regra, atua por intuição", disse. "Tem coisas previsíveis, que o legislador pode prever, e tem coisas imprevisíveis. Quando um problema novo vem para o juiz, (...)o juiz não pode se eximir de julgar, se eximir alegando falta ou obscuridade da lei. E o sistema dá orientação de como ele deve julgar: trabalhar com analogia, trabalhar com os princípios e com os costumes", analisou.
Conforme Zavascki, a Constituição de 1988 atribuiu "expressamente" ao Judiciário o controle de omissões legislativas. Ele disse que às vezes o legislativo prefere que a Justiça decida sobre determinadas questões.
"Eu dou exemplo da questão da Lei de Imprensa, que foi declarada não recepcionada (pela Constituição, em julgamento no Supremo). E nós não temos uma outra lei de imprensa. Se prefere, pelo menos por enquanto, que todas as pessoas relacionadas às questões dos meios de comunicação, do direito à informação e suas consequências, se resolva pelo juiz. Direito de resposta, direito à indenização", afirmou.
Foro privilegiado
Para o ministro, a prerrogativa de foro não é sempre favorável aos réus, embora acredite que o benefício possa ser questionado. Segundo a Constituição, o presidente da República, ministrosde Estado, senadores e deputados devem ser julgados necessariamente pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
"A prerrogativa de foro existe em prol de um julgamento que será justo e imparcial. Talvez se devesse reduzir um pouco a quantidade de autoridades com prerrogativa de foro", disse. "Se é verdade que esta palavra privilégio de foro é um privilégio, em outras palavras não é nenhum privilégio. Em tese, do ponto de vista de demora de julgamento, o caminho a ser percorrido no caso de julgamento originado em primeira instância é mais comprido", afirmou.
Excesso de processos
Teori Zavascki chegará ao STF com cerca de 5 mil processos em seu gabinete para julgamento. "É mais ou menos que tenho aqui (no STJ)", disse. "Sinceramente eu não vejo o que se possa fazer a não ser julgar", afirmou o ministro, sem criticar o sistema processual do Supremo e a quantidade de recursos possíveis para a mais alta Corte.
O mensalão do PT
Em 2007, o STF aceitou denúncia contra os 40 suspeitos de envolvimento no suposto esquema denunciado em 2005 pelo então deputado federal Roberto Jefferson (PTB) e que ficou conhecido como mensalão. Segundo ele, parlamentares da base aliada recebiam pagamentos periódicos para votar de acordo com os interesses do governo Luiz Inácio Lula da Silva. Após o escândalo, o deputado federal José Dirceu deixou o cargo de chefe da Casa Civil e retornou à Câmara. Acabou sendo cassado pelos colegas e perdeu o direito de concorrer a cargos públicos até 2015.
No relatório da denúncia, a Procuradoria-Geral da República apontou como operadores do núcleo central do esquema José Dirceu, o ex-deputado e ex-presidente do PT José Genoino, o ex-tesoureiro do partido Delúbio Soares e o ex- secretário-geral Silvio Pereira. Todos foram denunciados por formação de quadrilha. Dirceu, Genoino e Delúbio respondem ainda por corrupção ativa.
Em 2008, Sílvio Pereira assinou acordo com a Procuradoria-Geral da República para não ser mais processado no inquérito sobre o caso. Com isso, ele teria que fazer 750 horas de serviço comunitário em até três anos e deixou de ser um dos 40 réus. José Janene, ex-deputado do PP, morreu em 2010 e também deixou de figurar na denúncia.
O relator apontou também que o núcleo publicitário-financeiro do suposto esquema era composto pelo empresário Marcos Valério e seus sócios (Ramon Cardoso, Cristiano Paz e Rogério Tolentino), além das funcionárias da agência SMP&B Simone Vasconcelos e Geiza Dias. Eles respondem por pelo menos três crimes: formação de quadrilha, corrupção ativa e lavagem de dinheiro.
A então presidente do Banco Rural, Kátia Rabello, e os diretores José Roberto Salgado, Vinícius Samarane e Ayanna Tenório foram denunciados por formação de quadrilha, gestão fraudulenta e lavagem de dinheiro. O publicitário Duda Mendonça e sua sócia, Zilmar Fernandes, respondem a ações penais por lavagem de dinheiro e evasão de divisas. O ex-ministro da Secretaria de Comunicação (Secom) Luiz Gushiken é processado por peculato. O ex-diretor de Marketing do Banco do Brasil Henrique Pizzolato foi denunciado por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro.
O ex-presidente da Câmara João Paulo Cunha (PT-SP) responde a processo por peculato, corrupção passiva e lavagem de dinheiro. A denúncia inclui ainda parlamentares do PP, PR (ex-PL), PTB e PMDB. Entre eles o próprio delator, Roberto Jefferson.
Em julho de 2011, a Procuradoria-Geral da República, nas alegações finais do processo, pediu que o STF condenasse 36 dos 38 réus restantes. Ficaram de fora o ex-ministro da Comunicação Social Luiz Gushiken e o irmão do ex-tesoureiro do Partido Liberal (PL) Jacinto Lamas, Antônio Lamas, ambos por falta de provas.
A ação penal começou a ser julgada em 2 de agosto de 2012. A primeira decisão tomada pelosministros foi anular o processo contra o ex-empresário argentino Carlos Alberto Quaglia, acusado de utilizar a corretora Natimar para lavar dinheiro do mensalão. Durante três anos, o Supremo notificou os advogados errados de Quaglia e, por isso, o defensor público que representou o réu pediu a nulidade por cerceamento de defesa. Agora, ele vai responder na Justiça Federal de Santa Catarina, Estado onde mora. Assim, restaram 37 réus no processo.
Terra

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