(*) Ucho Haddad –
Faltando
horas para o início da malfadada e desnecessária Copa do Mundo, que
surrupiou bilhões de reais do bolso do brasileiro, o noticiário nacional
abriu espaço para um momento constrangedor e sem propósito. O
criminalista Luiz Fernando Pacheco, que defende o mensaleiro condenado
José Genoino Neto, ultrapassou com folga os limites do seu direito como
advogado e afrontou a instância máxima de um dos Poderes constituídos da
República: o Supremo Tribunal Federal.
Aos gritos e com dedo em riste, Pacheco passou a desafiar e ameaçar o
presidente da Corte, ministro Joaquim Barbosa, que há muito caiu nas
graças daqueles que clamam por ordem e progresso. Além do respeito às
leis e o fim da impunidade. Luiz Fernando Pacheco, que insiste em buscar
os holofotes na esteira de uma causa perdida, tem o direito à palavra,
prerrogativa inconteste do advogado. Contudo, uma coisa é fazer uso da
palavra, outra é postar-se como rábula de bordel.
Pacheco usurpou do seu direito e acabou levado para fora do plenário
do Supremo nos braços dos seguranças da Corte. Cumpriu-se a ordem do
presidente do Poder Judiciário, violentado em todas as suas instâncias.
Nem todos os que fazem o Judiciário pensam da mesma maneira, até porque
muitos são oportunistas de ocasião que pegam carona na teoria burra do
politicamente correto, mas não se pode negar a assertividade da decisão
de Barbosa.
Sem jamais ter sido um país sério, mesmo com mais de quinhentos anos
de existência oficial, o Brasil mergulhou na vala do descrédito no
momento em que Luiz Inácio da Silva, o malandro Lula, deu o primeiro
passo na rampa que leva ao Palácio do Planalto. Desde então, o
socialismo tupiniquim tenta transformar o País em um amontoado de
puxadinhos bolivarianos, como se a democracia brasileira fosse órfã de
ordenamento jurídico.
Não é assim que se constrói uma nação, não é assim que se esculpe o
futuro. Reza a Constituição Federal, a maior de todas as leis, que
“todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza”. E a
Carta Magna o faz com certeza plena e devoção invejável. Daí a ser
respeitada é outra discussão.
O grande impasse na moderna sociedade brasileira é que uma
carteirinha da OAB transforma o advogado em uma espécie de semideus.
Nove entre dez profissionais do Direito creem que podem tudo e mais um
pouco. Uma inscrição em determinado agrupamento profissional não garante
ao inscrito o direito de aviltar o estado democrático de Direito e
ultrajar, mesmo que a rigor, o conjunto legal vigente.
Desde que a Ação Penal 470 foi conclusa, pelo menos no âmbito do
trânsito em julgado das sentenças condenatórias, os defensores dos
condenados tentam justificar os respectivos fracassos erigindo a tese de
que a Corte proferiu decisão revanchista no julgamento do Mensalão do
PT, o maior e mais ousado escândalo de corrupção da história nacional. O
que se viu nesse longevo julgamento foi a aplicação implacável da lei,
muitas vezes benevolente com criminosos galhardos. A extensa maioria dos
condenados apostou na impunidade durante todo o tempo, apenas porque o
Brasil vive um momento quase infindável de aparelhamento criminoso do
Estado. Afinal, o Partido dos Trabalhadores busca perpetuar-se no poder a
reboque de um plano totalitarista que a qualquer momento pode
transformar o Brasil na versão agigantada da combalida e antidemocrática
Venezuela.
Contudo, causou espécie a nota de repúdio divulgada pela Ordem dos
Advogados do Brasil para condenar a decisão acertada do ministro Joaquim
Barbosa, que com firmeza não se curvou diante das ameaças de um
advogado que nos últimos tempos vem se notabilizando por seus excessos
comportamentais.
Há muito a OAB deixou de ser uma entidade classista para se
transformar em satélite político que se manifesta de acordo com a
própria conveniência. Discursos de encomenda que contemplam os atuais
ocupantes do Executivo podem render benesses, como indicações às
instâncias superiores do Judiciário. É de se considerar o quão magnânimo
sente-se o semideus, que carrega a carteirinha da OAB como se fosse uma
afiada cimitarra, que é indicado para ocupar o cargo de ministro do STF
ou de STJ. Não importa que seja um ignaro em termos jurídicos, pois o
outrora “notório saber” caiu em desuso na ditadura do bolchevique
pernambucano Lula.
Luiz Fernando Pacheco deveria se dar por satisfeito, pois a essa
altura, em qualquer país minimamente sério, estaria acompanhando a
abertura da Copa do Mundo atrás das grades. Como qualquer entidade
classista, a OAB é corporativista, não sem antes acreditar ser a filial
terrena do Céu. E explico os motivos de tal afirmação. O presidente da
entidade, Marcus Vinícius Furtado Coêlho, pode até acreditar que a
decisão do presidente do STF foi uma “agressão à democracia”, mas de
igual modo há de concordar que seu colega de profissão abusou do
devaneio emoldurado por rebuscados vernáculos que compõem o
“juridiquês”. Em fala ciclotímica, Pacheco rogou ao presidente da Corte,
mas disse, em seguida, que pegaria Joaquim Barbosa.
Marcus Vinícius Furtado Coêlho tem o direito de se expressar, até
porque diz a Constituição que “é livre a manifestação do pensamento,
desde que vedado o anonimato”, mas no mínimo foi vilipendio ao
raciocínio afirmar que “sequer na ditadura militar ousou-se ir tão longe
contra o exercício da profissão de advogado”.
Esse corporativismo burro e míope deve ser combatido pela sociedade,
sob pena de a nação tornar-se refém da anarquia legalizada por uma
classe profissional que faz da carteirinha e da adimplência contributiva
o arco e flecha que atenta contra a democracia. Quer dizer, então, que
fosse um pedreiro a esbravejar no plenário do Supremo a segurança da
Corte poderia inclusive descer a borracha. Ora, doutor Marcus Vinícius,
minha paciência tem limite, assim como meu raciocínio não é mulher de
bataclã.
A nota de repúdio da OAB nacional é de tal modo ridícula, que em meio
ao palavrório utópico traz frase que desdiz o líder dos advogados
verde-louros: “Em uma democracia, argumentos devem ser respondidos com
argumentos, e não com ato de força”. Sim, presidente, na democracia não
há espaço para o uso da força, exceto quando a ordem é atropelada e roga
por sua integridade e manutenção. E entenda por uso da força o desvario
verborrágico de quem deveria respeitar as leis como se fosse dogma
eterno.
Coêlho, o ser supremo da advocacia tupiniquim, por certo considera
normal um cidadão que adentra à OAB e passe a ofendê-lo e a ameaçá-lo.
Não sendo um ato dentro do que se entende como normalidade, o majestoso
advogado acionará a segurança da instituição para que o abusado intruso
seja ejetado do local. Mas o que vale na OAB não vale no Supremo, apenas
porque Marcus Vinícius assim o quer. Ou será que ele quer porque os
outros exigem que ele queira? Ou será que no rastro da Copa do Mundo o
magnânimo advogado decidiu jogar para a plateia?
Vou além… A OAB manifestou-se contrariamente à necessária e acertada
decisão de Joaquim Barbosa apenas porque o relator da Ação Penal 470
atuou com rigor e dentro da lei ao longo do julgamento, atrapalhando os
planos dos advogados que defendiam quadrilheiros que se apoderaram do
Estado. Em nenhum momento o povo brasileiro viu a OAB criticar esses
bandoleiros que agiram como aves de rapina a dilacerar a carniça. Em
suma, a grande pendenga da OAB é com o Poder Judiciário.
Se Luiz Fernando Pacheco tivesse protagonizado o mesmo e pífio
espetáculo no Palácio do Planalto, com muito menos tempo teria sido
imobilizado, algemado e levado à cadeia. E a OAB certamente não teria do
que reclamar ou quiçá teria coragem para tanto.
O mesmo aconteceria se a ópera bufa encenada por Pacheco tivesse
ocorrido no plenário do Senado Federal ou da Câmara dos Deputados.
Ademais, não custa lembrar que os presidentes de ambas as Casas costumam
acionar os seguranças para retirar baderneiros descontrolados que
tentam tumultuar o ambiente ou ousam desafiar os chefes do Poder
Legislativo.
Destaco que por muito menos fui preso no plenário de uma Comissão do
Senado apenas porque carregava em meio ao material de trabalho um farto e
explosivo dossiê contra um banqueiro oportunista, que durante anos a
fio financiou criminosamente algumas dúzias de parlamentares. Não
desafiei autoridades, não ameacei os doutos (sic) parlamentares, não
patrocinei cenas degradantes, mas fui retirado do local apenas porque um
então senador, ridículo e truculento, entendeu que eu deveria ser
constrangido por defender o Brasil e os brasileiros. À época a OAB não
se manifestou, assim como não se manifestou a classe que “representa” os
jornalistas.
A nota de repúdio da OAB torna-se ainda mais ridícula quando, à vista
d’olhos, lê-se o depoimento dos seguranças que retiraram Luiz Fernando
Pacheco do plenário do STF. Um afirmou que o advogado de José Genoino
Neto estava visivelmente embriagado, outro disse ter ouvido o
criminalista dizer que se tivesse uma arma daria um tiro na cara de
Joaquim Barbosa. Lembrem-se, caríssimos leitores, esse tal Pacheco
garante aos seus clientes que milita na advocacia criminal. Imaginem se
assim não fosse. Diante de tão escandalosas declarações, o presidente
Marcus Vinícius Coêlho deveria ter apresentado desculpas ao povo
brasileiro, não sem antes chamar o defensor do mensaleiro e falso
cardiopata para uma enxurrada de conselhos, quem sabe para longo
refestelar em confortável divã.
Luiz Fernando Pacheco, por sua vez, como qualquer arrogante que teima
em não reconhecer o próprio vexame, classificou como “ridículo” o
relatório da segurança do STF. “Ridículo. Repudio veementemente até
porque, como todos que me conhecem sabem, não bebo, rigidamente não
bebo. E desafio quem quer que seja a demonstrar o contrário. Fiz o que
fiz na maior sobriedade e faria de novo quando e onde se mostre a
tirania. Joaquim Barbosa, ainda que sóbrio, vive num porre seco”, disse
Pacheco a jornalistas.
Pois bem, não bastasse ter dito, ainda em plenário, que pegaria
Joaquim Barbosa e em seguida ameaçado de morte o ministro, o
criminalista ainda traz à baila um tal de “porre seco”. O que mostra o
nível de advocacia que esse senhor pratica e tenta salvar a qualquer
custo, à beira da notoriedade (sic) do banditismo político de alguns
supostos representantes do povo que hoje engrossam a massa carcerária
nacional.
Em relação a provar se Pacheco bebe ou não, creio que os
experimentados seguranças do Supremo não foram acometidos por um momento
de delírio por ocasião da feitura do relatório que compilou detalhes do
triste episódio que tomou conta do plenário da Corte na tarde de
quarta-feira, 11 de junho. Até porque, quem não sofre das faculdades
olfativas sabe identificar com certa facilidade quem ingeriu bebida
alcoólica em dose acima do aceitável.
Se desafiar é o mote do momento, desafio, então, os principais
criminalistas de São Paulo a confirmarem publicamente o que a mim
relatam nos bastidores acerca do triste comportamento de Luiz Fernando
Pacheco nos últimos tempos. Não estou a afirmar que Pacheco bebe, mas o
fazem seus respeitáveis colegas de advocacia criminal. Confirmar o que
dizem é uma questão de coragem. Pior é ouvir relatos de amigos próximos
do defensor de Genoino, que desolados com tudo mostram-se tristes quando
falam do comportamento de Luiz Fernando Pacheco.
Volto a insistir que não estou a dizer que Pacheco bebe e muito menos
que no momento do entrevero o advogado estava visivelmente embriagado.
Porém, diz a sabedoria popular que a fumaça surge onde existe ou existiu
fogo. E quando o assunto é fogo, os visivelmente embriagados têm uma
enorme facilidade de virarem a flama da incoerência. Mesmo assim, torço
por Pacheco.
Em relação ao presidente da OAB, Marcus Vinícius Furtado Coêlho,
lembro que sempre defendi os advogados da maledicência da opinião
pública, que de forma costumeira insiste em transferir a essência
delituosa do cliente para o defensor. E que o líder nacional dos
advogados sinta-se à vontade para rebater esse artigo, pois não costumo
emitir notas de repúdio para condenar o contraditório, ao mesmo tempo em
que cultuo como sacra oração o dístico que repousa no pavilhão
nacional: “Ordem e Progresso”.
(*)
Ucho Haddad é jornalista político e investigativo, analista e comentarista político, cronista esportivo, escritor e poeta.