Após imbróglio jurídico, desocupação ganha contornos políticos e ruas são disputadas por militantes de partidos de esquerda, sindicalistas e políticos
Bruno Huberman
Um dia depois da ação de reintegração de posse da área chamada de Pinheirinho, na periferia de São José dos Campos, interior de São Paulo, ex-moradores dividiam as ruas com centenas de militantes de partidos de esquerda, sindicalistas e políticos. A Polícia Militar isolou a região. Os comerciantes fecharam as portas com medo. A todo o momento, o barulho de sirenes chamava atenção nesta segunda-feira. Centenas de policias patrulhavam as vielas. Cerca de 7.000 pessoas estão desalojadas e foram para albergues, abrigos e casas de familiares e amigos.
A desocupação se transformou em um imbróglio jurídico, já que havia decisões diferentes da Justiça estadual, que determinava a reintegração de posse, e da federal, que chegou a anular a ordem de reintegração. No início da noite deste domingo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que a competência era mesmo da Justiça estadual. A área de 1,3 milhão de metros quadrados pertence à massa falida de uma empresa do investidor Naji Nahas. Cerca de vinte pessoas ficaram feridas e trinta foram presos.
O assunto também ganhou contornos políticos. Embora não se tratasse de área pública, o governo federal acompanhou de perto as negociações durante toda a semana. No domingo, o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, disse ter sido surpreendido pela ação policial. Nesta segunda-feira, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, colocou panos quentes: “Fomos surpreendidos por um processo que estava em plena negociação, mas não quero fazer críticas ao governo de São Paulo. Respeitamos a sua autonomia.”
A invasão de militantes de esquerda se intensificou nesta segunda-feira. Cerca de 100 pessoas da juventude do PSOL saíram de São Paulo no domingo rumo a São José dos Campos. Moradores ligados a grupos políticos e movimentos sociais reclamaram da centralização das negociações por integrantes do PSTU, partido de extrema-esquerda que estaria querendo impor sua ideologia, além de levar os louros sobre possíveis conquistas. Luiz Carlos Prates, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São José e um dos líderes que estiveram em Pinheirinho, disse que a operação foi uma medida traiçoeira dos governos estadual e municipal.
Os manifestantes, que chegaram a entrar em confronto com os polícias algumas vezes, atearam fogo em carros e estabelecimentos e organizaram uma manifestação no centro de São José dos Campos contra a operação, prometem resistir. “O nosso interesse é ficar no Pinheirinho”, afirma o metalúrgico. “Só sairemos de lá quando o governo apresentar uma alternativa definitiva para abrigar todas as famílias e não apenas abrigos provisórios”.
Desalojados - Quando foram retirados de suas casas na operação policial, os moradores receberam números de identificação para, mais tarde, recuperar seus pertences e ser encaminhados para abrigos provisórios. No entanto, a maior reclamação dos desalojados é não ter para onde ir. A prefeitura informou que disponibilizou cinco abrigos que comportam 8.000 pessoas, mas que, até agora, apenas 680 procuraram o poder público e foram encaminhadas para abrigos. A maioria prefere conseguir um teto por meio próprios.
A PM está liberando, aos poucos, o acesso ao local para as pessoas recuperarem os seus pertences. As famílias são acompanhadas por oficiais de justiça em suas casas e recebem ajuda de profissionais da prefeitura para retirar os móveis e eletrodomésticos. Foram disponibilizados oitenta caminhões para o transporte das cargas. Os pertences não reclamados serão encaminhados para depósitos. Depois que as casas forem esvaziadas, começará a demolição das residências. Estima-se que são cerca de 1.700 casas na área.
Há relatos de abusos dos policiais durante a operação. Segundo a PM, no entanto, a operação, que contou com um efetivo de 2.000 homens, ocorreu sem imprevistos e não foi violenta. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, disse que irá investigar possíveis abusos.
Sim, o governo federal poderia ter impedido a ação da Polícia Militar na região do Pinheirinho, em São José dos Campos (SP), se, em vez de se excitar com o cheiro de sangue dos pobres — que, felizmente, não correu —, tivesse tido a vergonha na cara e o bom senso de tomar uma medida em favor daquelas famílias. Já explico. Vocês vão se surpreender como tudo teria sido muito simples houvesse vontade resolver. O problema é que a atração pelo sangue era maior. Os palacianos apostaram no confronto. A petezada vislumbrou mais uma chance de jogar a população de São Paulo contra a polícia e contra o governo do estado.
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