terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Polícia secreta da Alemanha Oriental vendia cidadãos para empresas farmacêuticas do Ocidente para serem usados como cobaias em testes de medicamentos



Dezenas de milhares de pessoas foram testadas com drogas experimentais não aprovadas no Ocidente
Dezessete cobaias morreram no estudo de uma droga para tratamento de problemas cardíacos
A prática macabra foi exposta em um chocante documentário lançado na Alemanha
Allan Hall
A ex-comunista Alemanha Oriental vendia cidadãos para empresas farmacêuticas do Ocidente para serem usados como cobaias em testes de medicamentos.
Dezenas de milhares de doentes da antiga República Democrática da Alemanha foram tratados com medicamentos não aprovados no Ocidente para testar sua eficácia.
Detalhes do projeto ultrassecreto foram revelados nos arquivos da Stasi, antiga organização da polícia secreta de Berlim Oriental. O regime comunista lucrou milhões em moeda forte.
A ponte entre a Alemanha Oriental e Berlim Ocidental, fotografada no início da década de 1960. Arquivos recentemente abertos mostram como os agentes da Stasi venderam cidadãos secretamente para empresas farmacêuticas ocidentais para serem usados como cobaias.
Mas o custo humano era alto, com dezenas de pessoas mortas devido aos efeitos colaterais dos medicamentos, que contornavam os procedimentos de teste geralmente rigorosos exigidos pelas democracias ocidentais.
E para piorar, alguns pacientes receberam placebos (pílulas que não faziam efeito algum) para avaliar como respondiam em comparação aos outros que recebiam o medicamento adequado.
A prática foi exposta pelos jornalistas Stefan Hoge e Carsten Opitz e exibido esta semana na Alemanha em um chocante documentário intitulado “Tote und Deaths” (Mortos e Mortes).
Os arquivos da Stasi (quilômetros de papeis amarelados que a polícia secreta da Alemanha Oriental não conseguiu eliminar quando o Estado comunista implodiu em 1989) revelou detalhes de como o país se tornou um dos campos de experimentos mais importantes para as empresas farmacêuticas ocidentais.
A conspiração envolveu o Estado, médicos e grandes empresas farmacêuticas.
Os líderes do país comunista estavam felizes em implantar o programa em uma terra que só se destacava pela escassez.
“Havia farmácias que não tinham condições de fornecer 20% das drogas necessárias”, explica o historiador farmacêutico Christoph Friedrich, da Universidade de Marburg. “E essa escassez se estendia aos hospitais”.
Os arquivos da Stasi revelaram detalhes de como a Alemanha Oriental se tornou um dos campos de experimentos mais importantes para as empresas farmacêuticas ocidentais (arquivo)
O escândalo da talidomida no início da década de 1960 intensificou os critérios para experimentos médicos no mundo ocidental, inclusive na Alemanha Ocidental.
Novas exigências regulatórias para aprovação de mercado forçavam as fabricantes a conduzir testes clínicos ainda mais longos para seus medicamentos em um grande número de pacientes.
A Alemanha Oriental, por dinheiro, estava disposta a fornecer cobaias humanas, embora elas não desconfiassem que eram parte de um enorme experimento.
“Uma conferência secreta com membros do comitê central do Politburo responsáveis pela área da saúde preparou o cenário para um gigantesco acordo na primavera de 1983”, aponta o historiador Friedrich.
“Em hospitais selecionados, médicos de empresas farmacêuticas ocidentais podiam realizar testes clínicos com medicamentos não aprovados”.
“A papelada nos arquivos da Stasi mostram que foram assinados contratos entre empresas farmacêuticas do Ocidente e a companhia de comércio exterior da Alemanha Oriental. Em 1983 houve 20 experimentos, e em 1988 havia 165 em andamento”.
Os pesquisadores não encontraram documentos nos arquivos da Stasi ou nos registros do antigo ministério da saúde da Alemanha Orienta que indicassem que os pacientes sabiam que estavam de fato sendo usados como cobaias de teste.
O documentário não encontrou ninguém entre as grandes empresas farmacêuticas ocidentais que tivesse conhecimento do programa secreto, relata Opitz.
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