A carta de Yoani Sánchez obriga Lula a escolher entre a generosidade e a infâmia
Há menos de duas semanas, a blogueira cubana Yoani Sánchez endereçou ao presidente Lula uma carta cujo teor permaneceu desconhecido. Em primeira mão, VEJA.com reproduz a íntegra do documento.
Se venceu o medo da azia e, sobretudo, o desprezo por oposicionistas cubanos, Lula já leu ao menos o resumo da carta traduzida por algum assessor. Se o tradutor foi fiel ao texto, deve ter compreendido que Yoani não pode ser enquadrada em nenhuma das categorias invocadas pelos companheiros para desqualificar quem deles discorda. Não é uma agente do imperialismo ianque, não está a serviço dos exilados de Miami, não tem qualquer simpatia por ações violentas. É só uma jornalista que tenta ser independente numa ilha subordinada à mais velha ditadura do mundo. E só quer visitar o Brasil.
Em outubro de 2009, a primeira tentativa esbarrou nas autoridades de imigração, que lhe negaram o visto de saída necessário para apresentar aos brasileiros seu livro ”De Cuba, com carinho”. Sempre sem explicações, Yoani foi também impedida de viajar para a Polônia, para os Estados Unidos (onde receberia na Universidade de Colúmbia uma menção especial do prêmio Maria Moors Cabot) e para a Espanha, onde a aguardava o prêmio Ortega y Gasset.
Agora convidada para a apresentação de um documentário em Jequié, na Bahia, ela enviou a carta que, em seu começo, lembra os tempos da escravidão. Na chegada dos navios negreiros à costa continental, registra a blogueira, famílias vindas da África eram separadas em dois lotes: um desembarcava em Cuba, outro no Brasil. ”Sonhamos com a livre circulação entre as nações americanas”, escreveu Yoani.
O documentário, do brasileiro Dado Galvão, trata das atividades da blogueira, do movimento Damas de Branco e do fechamento do Canal 36 de Honduras durante a crise política decorrente da queda de Manuel Zelaya. A estreia está marcada para 1° de junho, no Centro de Cultura Antonio Carlos Magalhães, em Jequié. A entrada é livre. A presença de Yoani depende do governo cubano ─ e de Lula.
“O senhor tem dado mostras de que confia na boa-fé do governo cubano”, registra o penúltimo parágrafo. “Para manter viva essa confiança”, imagina Yoani, o governo cubano não recusaria uma solicitação do amigo Lula. ”O senhor estaria pedindo o que para qualquer brasileiro ─ e para qualquer ser humano ─ é um direito inalienável”.
A carta oferece a Lula uma chance de mostrar que a opção preferencial pela ditadura companheira não é de todo inútil. Depois de repreender o preso político Orlando Zapata por ter morrido de fome, o presidente brasileiro pode demonstrar que atitudes desonrosas trazem algumas vantagens. Por exemplo, conseguir que os irmãos Castro liberem uma jornalista para conhecer o Brasil.
Mais uma vez, Lula terá de escolher entre a sensatez e a infâmia. Ele decide.
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