Combinação de interesses de garimpeiros, madeireiros e também dos índios transforma em 'barril de pólvora' região com embates no sul do Amazonas
12 de janeiro de 2014 | 2h 00
JOSÉ MARIA TOMAZELA , ENVIADO ESPECIAL - O Estado de S.Paulo
HUMAITÁ (AM) - A combinação de garimpos, madeireiras e reservas indígenas com a quase ausência do Estado transformam a região sul do Estado do Amazonas numa área de conflitos. Em 25 de dezembro, revoltada com o desaparecimento de três homens numa área indígena da Transamazônica, uma multidão queimou veículos, barcos e instalações de atendimento ao índio em Humaitá, a 675 km de Manaus. Madeireiros se armam no distrito de Santo Antônio do Matupi, vizinho da Terra Indígena Tenharim Marmelos, depois que os índios anunciaram que vão reconstruir pedágios incendiados.
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Os indígenas se preparam para reagir caso haja novo ataque. "Estamos lidando com um barril de pólvora", disse o prefeito de Humaitá, Cidenei Lobo do Nascimento (PMDB). Cerca de 600 guerreiros tenharins, parintintins e jiahuis estão prontos para o confronto. "Da outra vez não reagimos para evitar sangue, mas índio não tem medo e, se tiver um ataque, nossa reação vai ficar para a história", afirmou Aurélio Tenharim, na presença do comandante militar da Amazônia, general Eduardo Villas Bôas. Segundo ele, os índios vão se defender com arcos, flechas e tacapes, mas o serviço de inteligência do Exército apurou que eles também têm armas de fogo.
O pedágio é pano de fundo de um explosivo conjunto de interesses. O distrito de Santo Antônio do Matupi, em Manicoré, ao lado da reserva dos tenharins, tem a maior concentração de serrarias do Estado. Além das 36 madeireiras legalizadas, há dezenas clandestinas. A terra indígena guarda imenso depósito natural de madeira nobre. Para o bispo de Humaitá, d. Francisco Merkel, os madeireiros estão no centro de uma campanha contra os índios porque querem a madeira da reserva. "Isso teve peso na revolta, pois muitos aproveitaram a situação dos desaparecidos para colocar à frente interesses econômicos."
Os índios acusam os madeireiros de furtar madeira da reserva. De acordo com o cacique Zelito Tenharim, eles abriram cinco estradas vicinais para entrar na área protegida a partir do km 180 da Transamazônica. "Toda madeira que está saindo do Matupi é da reserva. O Ibama fiscaliza nós (sic), mas não fiscaliza o madeireiro", disse o cacique ao general Villas Bôas.
Madeireiros do distrito integravam o grupo que, após o primeiro conflito, no dia 27 de dezembro, invadiu a reserva e incendiou os postos de pedágio dos índios. O presidente da Associação dos Madeireiros de Matupi, Samuel Martins, repudiou a acusação dos índios e disse que a madeira provém de áreas de manejo florestal.
Fiscalização. O Ibama não dispõe de efetivo e frota para manter uma fiscalização eficiente. A sede do órgão em Humaitá, que guarda pilhas de madeira apreendida, fica sem segurança à noite. Das oito viaturas, cinco estavam em manutenção ou conserto. E dos quatro servidores, apenas um está apto a fiscalizar.
Os minérios também são alvo de disputas. Os índios estão sobre grandes jazidas de cassiterita, mas o que atrai mineradores e garimpeiros são ouro e diamante. Aventureiros já tentaram abrir garimpos no Rio Marmelo, no coração da reserva. Dos seis garimpos em operação no Amazonas, dois estão na região.
Na presença do general Villas Boas, os índios usaram a defesa desse território como argumento para manter o pedágio na Transamazônica. "O pedágio é o único que não dá trabalho para o governo brasileiro. Suspender a cobrança é perigoso, pois os tenharins podem se aliar com os empresários, e aí vai embora madeira e vai ter garimpo. Nós sabemos onde tem ouro e diamante aqui e não queremos fazer isso, mas, na necessidade, pode acontecer. Eu não vou conseguir segurar meu povo", disse o cacique Zelito Tenharim.
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