As
hostes militantes estão destruindo o que resta de inteligência
brasileira. O país nunca foi tão estúpido e tão cheio de si; tão
ignorante e tão orgulhoso; tão cretino e tão altivo; tão burro e tão
cioso de sua sabedoria. Um livro de
Monteiro Lobato foi parar no STF. Acusado de racismo, há quem pretenda
cassá-lo da lista do MEC. Reproduzo trecho de reportagem da VEJA.com. Volto em seguida:
O Supremo
Tribunal Federal (STF) discute, na noite desta terça-feira, se libera o
uso do livro Caçadas de Pedrinho, de Monteiro Lobato, na rede pública de
ensino. A audiência foi convocada pelo ministro Luiz Fux após o STF
receber um mandado de segurança, impetrado pelo Instituto de Advocacia
Racial, o Iara, e pelo técnico em gestão educacional Antônio Gomes da
Silva Neto, alegando que a obra possui elementos racistas.
O debate
não é novo. Em 2010, após uma denúncia da Secretaria de Promoção da
Igualdade Racial, o Conselho Nacional de Educação (CNE) determinou que a
obra fosse banida das escolas. A repercussão do infeliz episódio fez
com que o Ministério da Educação (MEC) pedisse ao CNE para reconsiderar a
questão. O veto, então, foi anulado.
Agora,
contudo, a discussão retrocede. De acordo com o STF, o instituto e o
técnico querem, com o mandado de segurança, anular o último parecer do
CNE. Não faltam justificativas estapafúrdias para pedir a censura da
obra. Eles afirmam que “não há como se alegar liberdade de expressão em
relação ao tema quando da leitura se faz referências ao negro com
estereótipos fortemente carregados de elementos racistas”. O documento
diz ainda que o livro é utilizado como “paradigma” e, por isso, as
regras adotadas para ele devem nortear a aquisição também, pela rede
pública, de qualquer obra literária ou didática que tenha “qualquer
forma de expressão de racismo cultural, institucional e individual”.
Publicado
em 1933, o livro povoa o imaginário das crianças e faz parte do acervo
do Programa Nacional Biblioteca na Escola (PNBE). Escrito por um dos
maiores nomes da literatura infantil brasileira, ele narras as aventuras
da turma do Sítio do Picapau Amarelo em busca de uma onça-pintada. As
infundadas alegações de racismo estariam presentes em trechos como: “Tia
Nastácia, esquecida dos seus numerosos reumatismos, trepou, que nem uma
macaca de carvão” e “Não é a toa que macacos se parecem tanto com os
homens. Só dizem bobagens.”
O ministro
Luiz Fux afirma que espera, com a audiência, “ensejar um desfecho
conciliatório célere e deveras proveitoso para o interesse público e
também nacional”. Entre os convocados para o debate, estão os próprios
autores do mandado, além do ministro da educação, Aloizio Mercadante, da
presidente do CNE, Ana Maria Bettencourt, ed o procurador-geral da
República, Roberto Gurgel.
Voltei
A simples convocação da audiência, num caso assim, já é evidência de degradação cultural, política e ética. Monteiro Lobato e qualquer outro autor que pertençam ao acervo da literatura brasileira devem ser objetos de trabalho em sala de aula. Os professores existem, entre outras razões, para orientar as leituras dos alunos, explicar em que contexto as obras foram produzidas, as circunstâncias históricas etc.
A simples convocação da audiência, num caso assim, já é evidência de degradação cultural, política e ética. Monteiro Lobato e qualquer outro autor que pertençam ao acervo da literatura brasileira devem ser objetos de trabalho em sala de aula. Os professores existem, entre outras razões, para orientar as leituras dos alunos, explicar em que contexto as obras foram produzidas, as circunstâncias históricas etc.
Já tratei sobre este assunto no dia 29 de outubro de 2010.
Pensei que a questão estivesse resolvida. Não está. Antonio Gomes da
Costa Neto, mestrando da UnB, que denunciou Monteiro Lobato, afirmou em
entrevista à Folha que não quer censurar Lobato. E fez o seguinte
comentário estupefaciente:
“Os professores, no dia a dia, não têm o preparo teórico para trabalhar com esse tipo de livro. Então, não é que ele deva ser proibido. O que não é recomendado é a sua utilização dentro de escola pública ou privada.“
“Os professores, no dia a dia, não têm o preparo teórico para trabalhar com esse tipo de livro. Então, não é que ele deva ser proibido. O que não é recomendado é a sua utilização dentro de escola pública ou privada.“
Ah, bom! É
o mesmo argumento que se empregava no passado para tirar de milhões de
brasileiros o direito de votar: eles seriam muito ignorantes para isso e
acabariam fazendo besteira. É o argumento que a censura empregava
durante as ditaduras havidas no Brasil, seja a de Getúlio, seja a
militar: falta capacidade às pessoas para discernir o bem do mal, e a
exposição a material potencialmente nocivo lhes causará prejuízos. A
esquerda adere aos argumentos que dizia servirem antes aos
conservadores. Não é, como se nota, que ela fosse a favor da liberdade;
apenas era contra a censura aplicada pelos adversários. Quando aplicada
pelos aliados, tudo bem!
É um
escárnio. Submete-se Monteiro Lobato a padrões, debates e proselitismos
que estão postos hoje em dia, mas que não estavam dados então. É claro
que não se descarta a possibilidade de um professor trabalhar em sala de
aula a figura de Tia Nastácia — que, atenção!, é um dado da formação
histórica, familiar, social e moral brasileira. Que seja, pois, tema de
aula se for o caso. Proibir a obra ou meter nela uma tarja de “racista” é
uma estupidez sem-par.
Uma boa questão para Luiz Fux, que é judeu
Deverá agora “O Mercador de Veneza” vir com a advertência: “Cuidado! Obra antissemita, só recomendável para quem está devidamente instruído sobre este assunto”. Ou, do mesmo Shakespeare, sobrepor à capa de “Otelo” algo assim: “Cuidado! Sugere-se que temperamento desequilibrado do protagonista pode estar relacionado à sua origem racial”? Vai-se proibir Alexandre Herculano, em Portugal ou em qualquer lugar, ou apensar um tratado a seus livros, advertindo para a possível manifestação de preconceito contra a fé islâmica? É o fundo do poço moral, a que não se chega sem uma dose cavalar de ignorância, preconceito às avessas, estupidez e, obviamente, patrulha ideológica.
Deverá agora “O Mercador de Veneza” vir com a advertência: “Cuidado! Obra antissemita, só recomendável para quem está devidamente instruído sobre este assunto”. Ou, do mesmo Shakespeare, sobrepor à capa de “Otelo” algo assim: “Cuidado! Sugere-se que temperamento desequilibrado do protagonista pode estar relacionado à sua origem racial”? Vai-se proibir Alexandre Herculano, em Portugal ou em qualquer lugar, ou apensar um tratado a seus livros, advertindo para a possível manifestação de preconceito contra a fé islâmica? É o fundo do poço moral, a que não se chega sem uma dose cavalar de ignorância, preconceito às avessas, estupidez e, obviamente, patrulha ideológica.
Já contei
aqui de um amigo articulista que foi “molestado” — sim, molestado
moralmente! — porque, num artigo sobre economia, escreveu que via
“nuvens negras” no horizonte. Quis saber o militante: “Nuvens negras
como sinal de coisa ruim? Não pode! É racismo”. Desde a “Ilíada” pelo
menos, de Homero, nuvens negras estão associadas a maus presságios, são
prenúncios de acontecimentos aziagos — e os negros nem sequer haviam
ainda entrado na história dita ocidental. Há nuvens negras em Machado de
Assis, um autor considerado negro! Aliás, vejam vocês, ele também
espelha em sua obra as relações sociais de seu tempo. Sem contar que,
antes das tempestades, o céu costuma, efetivamente, enegrecer, não é?
Querem
mandar Monteiro Lobato de volta para a cadeia, agora uma cadeia moral.
Em breve, Monteiro Lobato só poderá ser recomendado depois da leitura do
livro “Emília, a boca de trapo, pede desculpas por todas as ofensas a
Tia Nastácia”.
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