quarta-feira, 12 de junho de 2013

DESSA ENTREVISTA NINGUÉM TOMOU CONHECIMENTO : Em entrevista inédita, Jacob Gorender diz ser contra punição a torturador e Lei da Anistia






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DIEGO MONTEIRO GUTIERREZ
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
O historiador e militante comunista Jacob Gorender afirmou, em entrevista exclusiva à Folha no ano passado, ser contra arevisão da Lei da Anistia e contra a punição a agentes que praticaram tortura durante a ditadura militar (1964-1985).
"Não deve haver mais punição, já passou, mesmo para os torturadores. Mas [é preciso] expor os fatos com os nomes. Quem foi torturador deve ter o nome exposto", disse Gorender.
Protagonista de uma das trajetórias mais singulares da história recente, o intelectual autodidata, dirigente comunista, preso político e veterano da 2ª Guerra Mundial Jacob Gorender morreu ontem aos 90 anos, em São Paulo.
Apesar de a saúde já debilitada e da aparência frágil, Gorender conversou com a Folhaem sua casa, no bairro da Pompéia, zona oeste de São Paulo. Leia abaixo trechos da entrevista.
Eduardo Knapp/Folhapress
O historiador Jacob Gorender em sua casa, no bairro da Pompéia, em São Paulo; ele morreu nesta terça (11), na capital paulista
O historiador Jacob Gorender em sua casa, no bairro da Pompéia, em São Paulo; ele morreu nesta terça (11), na capital paulista
Folha - Como o sr. vê a criação da Comissão da Verdade pela presidente Dilma?
Jacob Gorender - Acho que essas comissões da verdade estão aparecendo em vários países: Argentina, Chile e Venezuela. Em vários deles, há uma catarse. A sociedade está se purificando ao expor a verdade do que aconteceu, então é isso que deve ser feito. Outras pessoas poderiam participar, mas tudo bem.
O sr. aprova que a comissão verifique apenas crimes perpetrados pelo Estado, como foi dito por alguns dos membros da comissão?
Isso eu acho errado. Sem punição, mas [é preciso] averiguar tudo, todos os nomes. O Pérsio Arida, que polemizou com Ustra [coronel reformado Carlos Alberto Brilhante Ustra, 80,], foi um dos militantes que foi preso por Ustra no DOI-Codi (Destacamento de Operações de Informações do Centro de Operações de Defesa Interna) e torturado. E houve uma polêmica que saiu na Folha [em 2011] entre Ustra e Arida.
Eu acho que a averiguação e o esclarecimento desse tipo de coisa são o que importa. Para investigar os fatos, não deve haver limites, tudo deve ser aberto, exposto, lido e publicado, mas sem punições carcerária, judiciais etc.
Como o senhor encara a demanda de diversos grupos, ONGs, familiares e entidades sociais para rever a Lei da Anistia?
Penso que o que importa agora, como historiador, é recuperar a verdade dos fatos. Mas sou contra qualquer punição para qualquer um dos lados.
Não deve haver mais punição, já passou, mesmo para os torturadores. Mas [é preciso] expor os fatos com os nomes. Quem foi torturador deve ter o nome exposto. O que ele fez deve ser apurado, o Ustra e outros que trabalharam nos Dops (Departamento de Ordem Política e Social) e nos DOI-Codi e em todos os lugares que havia perseguição política e torturas etc. Mas não punição, acho que isso já não interessa mais. Não faz sentido prender um senhor de mais de 70 anos por um crime cometido há 30 anos.
Mesmo se forem apenas escrachos, como alguns grupos vêm fazendo?
Não interessa nada de punição, mas expor os fatos. O pior torturador não tem de ser punido agora, mas tem de dar o nome dele e mostrar o que ele fez. O Brasil passa por um período único na sua história política, de liberdade total. O Brasil sempre se caracterizou por possuir uma classe dominante extremamente antidemocrática, ditatorial e com pouquíssima liberdade política. Hoje, isso mudou e possuímos total liberdade, devemos aproveitar este momento e não se prender ao passado. Não faz sentido alterar a Lei da Anistia.
Então o sr. não concorda com a posição de diversos grupos que defendem a revisão da Lei da Anistia?
O fim da Anistia não traria nenhum beneficio para o país e para a democracia brasileira. A anistia deve continuar ampla, geral e irrestrita, mas todos os fatos devem ser apurados e todos os torturadores, guerrilheiros e ações, identificados, arquivados e estudados.
A Argentina alterou sua Lei da Anistia. Como o sr. viu essa mudança?
Na Argentina, foi diferente. A ditadura matou 15 mil pessoas mais ou menos, tanto da resistência como também inocentes, pessoas que circunstancialmente estavam envolvidas nos fatos. Então, isso é crime.
Como o sr. vê as indenizações?
Sou contra as indenizações, ninguém deve ser indenizado. Se sofreu, sofreu, acabou, ninguém me propôs para eu ser indenizado. O Ziraldo obtém uma indenização de R$ 400 mil, outro, de R$ 1 milhão. Então sou contra indenizações, ninguém lutou por isso, eu sou contra. Sou a favor da exposição dos fatos.

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