Ultrapassados os movimentos revolucionários e as revoltas de 1922 no Rio de Janeiro, de 1923 no Rio Grande do Sul, de 1924 em São Paulo, da Coluna Miguel Costa/Prestes entre 1925 e 1927, vamos desembocar na Revolução de 1930 que consegue o que os outros movimentos não conseguiram: por um fim à política do café-com-leite fundamentada no poder das oligarquias paulista e mineira que lideravam a política nacional determinando o resultado das eleições, indicando, inclusive, o presidente da república.
Com a vitória na Revolução de 30, Getúlio Vargas implementa um governo forte e centralizador que contrariava vários segmentos que haviam apoiado sua ascensão ao poder. Particularmente, o Estado de São Paulo clamava por um tratamento digno de suas lideranças e por uma Constituição.
Tal crise originou, como já foi estudado anteriormente, a Revolução de 1932 que teve como conseqüência principal a elaboração da Constituição de 1934 que, influenciada pela Constituição alemã de Weimar, apresentava características liberais e centralizadoras.
O período do governo constitucional de Getúlio Vargas foi uma fase marcada pelo choque entre duas correntes ideológicas, influenciadas pelas ideologias de origem européia : a Ação Integralista Brasileira (AIB) e a Aliança Nacional Libertadora (ANL).
A AIB, nascida em São Paulo, fundada e liderada por Plínio Salgado caracterizou-se por ideologia e métodos fascistas. Pretendia a criação de um "Estado Integral", ditatorial, com um só partido e chefe único.
A ANL, por sua vez, surgiu como um movimento de Frente Popular, de composição variada contra o fascismo.
Desde sua fundação, a Aliança Libertadora Nacional, contava com a ativa participação de comunistas (Luís Carlos Prestes era seu presidente honorário) e propunha a reforma agrária, constituição de um governo popular, cancelamento das dívidas externas e nacionalização das empresas estrangeiras.
Os violentos choques entre integralistas e comunistas eram habilmente utilizados por Getúlio Vargas, que mostrava à classe média e aos militares os perigos de uma política aberta.
O medo à subversão vermelha e os discursos inflamados de Luís Carlos Prestes levaram o Congresso Nacional a promulgar uma Lei de Segurança Nacional, concedendo ao governo federal amplos poderes para reprimir a ação da ANL.
Em 13 de julho de 1935 o QG da ANL é invadido por forças do governo e com base nos documentos achados em seu interior a organização é acusada de ser financiada pelo comunismo internacional.
A prisão de alguns líderes, o fechamento da ANL e a impossibilidade, agora, de chegar legitimamente ao poder levaram a ala mais radical da Aliança a uma frustrada tentativa (intentona) de implantação do comunismo no Brasil pela força das armas, liderada por Luís Carlos Prestes, que termina no Rio de Janeiro, em 27 Nov 35, com a prisão dos insurretos.
Apoiada pelo Komintern, a fracassada Intentona, deixou cicatrizes profundas nas Forças Armadas, particularmente no Exército.
A partir de então, a Força Terrestre manter-se-ia sempre vigilante e interviria com firmeza sempre que a ameaça comunista pairasse sobre o Brasil.
Prestes e o Levante Comunista de 1935
Entre os dias 23 e 27 de novembro de 1935, algumas guarnições militares sediadas em Natal (RN), Recife (PE) e no Rio de Janeiro rebelaram-se, em nome da Aliança Nacional Libertadora, contra o governo constitucional de Getúlio Vargas.
As ordens da insurreição partiram de um pequeno núcleo de conspiradores do Partido Comunista liderados por Luís Carlos Prestes que, acompanhando pela agente da Internacional Comunista Olga Benário, vivia clandestinamente num bairro do então Distrito Federal.
Rapidamente a revolução militar foi sufocada (denominada de Intentona Comunista de 1935), provocando como reação a ela a maior onda de prisões até então vista na história do país.
A ajuda soviética aos comunistas brasileiros
A atriz Camila Morgado interpreta Olga no cinema
Tem sido um enigma histórico que atravessa os tempos descobrir qual o real motivo que levou os soviéticos a apoiarem o levante comunista de 1935, num país tão distante como o Brasil. Por que razão eles financiaram e deram apoio logístico a que revolucionários que agiam do outro lado do mundo dessem início à uma rebelião?
Estranha-se ainda mais porque tal apoio deu-se justamente quando a política da Comintern (a Internacional Comunista controlada por Moscou) já se alinhava em torno de propostas defensivas e não ofensivas como foi o golpe de Prestes. Sabe-se que houve um empenho pessoal do presidente do Comitê executivo da Comintern, o professor Dimitri Manuilski, para que a operação brasileira tivesse sucesso.
Outros indicam que os soviéticos se fiaram nos relatórios completamente irreais apresentados pelos dirigentes do PC brasileiro, enviados à direção da Comintern.
Em agosto de 1935, por exemplo, o dirigente Fernando de Lacerda afirmava em sua exposição ao VII Congresso da Comintern, que "milhões de brasileiros se reuniam em torno da Aliança Nacional Libertadora" e que o "povo enfurecido com a ação do governo contra a ANL (Aliança Libertado nacional, frente anti-fascista liderada pelos comunistas brasileiros) agitava greves e acorria aos milhares aos comícios de protesto"; quando, de fato, o intelectual marxista Caio Prado Júnior apenas conseguia mobilizar 5.000 simpatizantes num protesto contra o fechamento da Aliança, determinado por decreto presidencial em 17 de julho de 1935.
Outros atribuem a Antônio Maciel Bonfim, o Miranda, o líder do PC na época, a responsabilidade por ter defendido as propostas insurrecionais, fazendo crer aos soviéticos que bastava um pequeno impulso do Partido para que o país inteiro entrasse em rebeldia aberta contra Vargas. Todavia, nada disso parece realmente convincente. Relatórios delirantes de chefes revolucionários são uma constante: todo o dirigente comunista gostava de afirmar aos seus pares que sua organização atingira a "alma do proletariado", que mais do que nunca as "condições objetivas eram propícias", e que a revolução "está às portas".
Os soviéticos já deviam estar cansados de receber este tipo de relatório, principalmente de latino-americanos. Gramsci poderia estar certo ao afirmar que a verdade é sempre revolucionária, mas o mesmo não se pode dizer dos relatórios dos revolucionários.
A possível e verdadeira razão do apoio soviético foi o fascínio que Luís Carlos Prestes exerceu sobre os dirigentes da Cominter, principalmente Manuilski (um burocrata encantado em poder conviver com um revolucionário legendário e de carne e osso). Os feitos militares de Prestes comandando a coluna invicta haviam corrido o mundo. Seguramente foi a insistência do caudilho comunista em afirmar as possibilidades de sucesso de uma rebelião no Brasil que os convenceu. Além do mais, sua seriedade, honestidade e retidão de caráter, aliados a uma vida ascética e disciplinada, faziam de Prestes um vivo contraste com os aventureiros latino-americanos que viviam rondando Moscou com sugestões dementes.
Foi a palavra dele, a certeza em afirmar o sucesso da rebelião e não os relatórios de figuras menores como Fernando de Lacerda e "Miranda", quem convenceu os soviéticos de que era possível derrubar o governo do "reacionário" Getúlio Vargas.
Por igual, não pode-se descartar a tentação otimista que a proposta prestista oferecia naquela ocasião. Os comunistas só tinham conhecido a derrota. Foram destroçados na Europa Ocidental pela força do nazi-fascismo enquanto que na China os maoístas encontravam-se cercados pelas campanhas de extermínio ordenadas pelo general nacionalista Chiang Kai-shek. Por que, devem ter pensado, não tentar inverter o clima derrotista que parecia contagiar o movimento comunista como um todo? O Brasil era um recanto remoto e desconhecido, exótico o suficiente para excitar a imaginação dos soviéticos e, quem sabe, ali poderia, por meio de um gesto de audácia, ter início a mudança da maré a favor dos vermelhos. Se o intento de Prestes fosse bem sucedido, as forças fascistas poderiam aliviar a pressão sobre a União Soviética e desviar-se para a América Latina. Os soviéticos, enfim, viram que não tinham nada a perder em apoiar o ex-líder da coluna.
Prestes, o motim feito homem
Integrantes da Coluna Prestes
Nos anos trinta, Luís Carlos Prestes (um ex-capitão do exército, nascido em Porto Alegre, em 1898) era inquestionavelmente um dos personagens mais populares do país, situação de fama e prestígio que Getúlio Vargas só alcançaria posteriormente. A celebridade dele adviera das notáveis façanhas que desempenhara na chefia do estado-maior da Coluna, que o qualificaram corno um dos mais brilhantes guerrilheiros da História contemporânea. Realmente, fora um feito incrível marchar a cavalo por mais de 24 mil km pelo interior do Brasil dando combate as mais variadas forças que lhe saíram no encalço.
O que eles viram foi um choque. Os jovens oficiais da Coluna Prestes (1924-27) não podiam imaginar que pudesse existir tanta barbárie e primitivismo no Sertão do país. Por onde cavalgaram depararam-se com populações quase que saídas do neolítico, brutalizadas por uma estrutura fundiária atroz que as reduzia à um vida isolada e infeliz, sem os mínimos confortos da civilização e da modernidade.
Quando Prestes exilou-se na Bolívia, juntamente com mais de seiscentos sobreviventes da Coluna Invicta, em fevereiro de 1927, seu destino já estava traçado. Havia-se encerrado um dos maiores feitos de militares brasileiros e ele revelara-se como uma verdadeira raposa do Sertão. A indignação de Prestes com a miséria e a iniqüidade social existentes num país prodigioso como o Brasil, nunca mais o abandonou. O rebelde virou um motim feito homem.
Abordado no exílio pelo então secretário-geral do Partido Comunista, Astrogildo Pereira, ele rapidamente passou a dominar a literatura marxista posta ao seu alcance. No entanto, sua entrada oficial no PC só foi oficializada sete anos depois, em 1934, por insistência do Presidente do Comitê Executivo da Internacional Socialista, Dimitri Manuilski.
Da Bolívia, Prestes seguiu para Buenos Aires, travando contato mais estreitos com os conspiradores da revolução que se tramava contra a República Velha. Prestes denunciou as promessas da Aliança Liberal (formada pelas oligarquias dissidentes do RGS e da Paraíba), tais como o voto secreto, a liberdade eleitoral, a honestidade administrativa, como sendo incapazes de "interessar à grande maioria da nossa população". No Manifesto de Maio de 1930 conclamou o povo à realização da revolução agrária e a arregimentação das forças para "a luta antiimperialista realizada e sustentada pelas grandes massas da nossa população".
O rompimento de Prestes com seus outros companheiros da coluna, como Cordeiro de Farias, João Alberto e Juarez Távora, foi definitivo. Desde então, em vários momentos da história republicana, eles se reencontrarão mas em trincheiras opostas.
Especula-se até os nossos dias se os destinos da Revolução de 30 não teriam sido outros, bem mais profundos e radicais, se ele tivesse aceitado o seu comandante militar( é opinião de Maria Cecília Spina Forjaz, in "Tenentismo e política", 1977). Vargas nunca se celebrizou como chefe de tropas, era um cérebro eminentemente político. Assim sendo talvez na presença de Prestes ao lado dele, de Vargas, pudesse ter acelerado certos projetos sociais de uma maneira mais eficaz ou, na dialética tão comum aos processos revolucionários, o líder militar poderia ter-se convertido no líder político.
Para ligar "O Cavaleiro da Esperança" à Aliança Liberal, o projeto Varguista de chegar ao poder, Getúlio remeteu ao líder da coluna o valor de 100 mil pesos argentinos para que ele aderisse a sua causa ( Prestes depois doou esses valores à Internacional Comunista, cuja sede ficava em Montevidéu).
O fato é que Prestes, negando-se a participar da revolução proposta pelos emissários de Getúlio, ficou de fora do acontecimento político e social mais significativo do Brasil contemporâneo: a Revolução de 30. Foi um dos tantos erros políticos dele. A raposa do sertão mostrava-se arredia em participar das confabulações citadinas, sentindo-se estranha em meio àqueles políticos retóricos.
Deste modo, ao eclodir o movimento de 3 de outubro de 1930, "O Cavaleiro da Esperança" encontrava-se não só rompido ideologicamente com seus ex-companheiros da coluna como totalmente afastado da revolução conduzida por Vargas. Ainda em Buenos Aires, estava totalmente isolado, sem que tivesse qualquer elo de ligação significativo com o Brasil. Deste modo, só lhe restou aceitar o convite dos soviéticos, sabendo-o um recém-converso ao marxismo, para que fosse visitar Moscou, para onde embarcou em 1931.
1. RAÍZES DO LEVANTE
Quem desejar compreender os acontecimentos dramáticos de 1935 terá que voltar algumas páginas atrás na nossa história política e rememorar as origens do Movimento Comunista no Brasil.
Após a Revolução Bolchevista de 1917 intensificou-se no mundo inteiro a propaganda ideológica marxista-leninista, antes mesclada às manifestações do anarquismo e sem maior expressão.
No Brasil, desde 1919 foram registradas várias tentativas de implantação do comunismo. Somente em 1922, porém, logrou o Partido Comunista se estabelecer no país, tirando proveito da mobilização ocorrida no Rio de Janeiro e Niterói entre 25 e 27 de março. O Congresso Constitutivo do Partido Comunista logo aderiu ao Movimento Comunista Internacional, aceitando as 21 condições de admissão à Terceira Internacional, também conhecida como Komintern, em janeiro de 1924. Esta agência central fundada por Lênin em 1919 passara a ser a pedra angular da política exterior soviética. Através dela, Moscou, impondo disciplina férrea aos militantes, dirigia as atividades comunistas do mundo inteiro.
Dentre as citadas 21 condições merece destaque especial a 6ª, como expressão do fanatismo ideológico que o Komintern procurava engendrar nas organizações bolchevistas:
"Todos os Partidos Comunistas devem renunciar não somente ao patriotismo como também ao pacifismo social e demonstrar sistematicamente aos proletários que sem a derrubada revolucionária do capitalismo não haverá desarmamento e paz mundial."
Inaugurava-se pois o comunismo no Brasil negando a índole pacífica do povo e a noção de Pátria. Nos primeiros anos de atividade, ele desenvolveu intensa infiltração, procurando agitar principalmente os meios operários. A reação legal determinada pelo governo, consciente dos objetivos perniciosos do movimento, e mais tarde a intervenção das correntes de direita, inspiradas na versão nativa do fascismo em ascensão na Europa, começaram a neutralizar fortemente a ação vermelha que, ademais, não conseguiu obter o apoio popular e assim revelou grande vulnerabilidade.
Sob a ameaça de desagregação, a organização comunista brasileira sentiu a necessidade de atrair um líder que pudesse polarizar a atenção e a admiração das massas, dando autenticidade ao movimento. Entre os nomes lembrados destacou-se o do ex-capitão do Exército Luís Carlos Prestes.
2. CAVALEIRO DA ESPERANÇA.
Luís Carlos Prestes adquiriu renome nacional após a Revolução de 1924, quando, com um grupo de revolucionários, percorreu durante três anos grande parte do território nacional, perseguido pelas tropas legalistas que jamais conseguiam agarrá-lo. Dessa façanha derivou-se o cognome de Cavaleiro da Esperança. Após essa aventura, a Coluna Miguel Costa – Prestes, derrotada, internou-se na Bolívia. Meses depois Prestes foi procurado em Porto Suarez por Astrogildo Pereira, um dos dirigentes do Partido Comunista Brasileiro (PCB), do qual recebeu, após longas conversas, várias obras de doutrinação marxista-leninista. A semente estava lançada.
Em agosto de 1929, quando o PCB pensou em lançar um candidato próprio à Presidência da República, o nome de Prestes foi lembrado e Leôncio Basbaum foi enviado a Buenos Aires para consultá-lo. Em 1930, alguém lembrou-se dele para a chefia militar da revolução. Foi então convocado para entrevistar-se com Getúlio Vargas e Oswaldo Aranha. De regresso à Argentina, porém, Prestes lançou um manifesto no qual condenava a revolução que se articulava e fazia nova profissão de fé, aderindo ao Comunismo.
Mais tarde, em 1931, os agentes soviéticos Max e Olga Pandarkye convenceram Prestes a seguir para a Rússia a fim de aprimorar seu doutrinamento político. Durante alguns anos fez cursos de liderança e capacitação marxista-leninista, ao mesmo tempo que trabalhava como engenheiro em Moscou. Chegou a ser eleito membro do Comitê Executivo do Komintern. Regressou ao Brasil em abril de 1935 para assumir a liderança do movimento comunista, tornando-se ainda o presidente de honra da Aliança Nacional Libertadora, mentora da rebelião que se preparava.
Transformara-se em fanático do credo vermelho, abdicando de seus próprios sentimentos nacionalistas em nome dos quais levantara a bandeira de rebeldia anos atrás. Em 1946, iria comprová-lo, pois, anistiado e senador, surpreenderia o Senado Federal com a declaração de que, se o Brasil estivesse em guerra com a União Soviética, jamais pegaria em armas contra os soviéticos.
3. ALIANÇA NACIONAL LIBERTADORA – SOMBRA DO PCB.
No Brasil, como no resto do mundo, na década de 30, enfrentavam-se duas correntes ideológicas irreconciliáveis, provindas de modelos europeus – o Comunismo e o Fascismo, sendo que este era representado desde 1932 Pelo movimento integralista, liderado pelo escritor Plínio Salgado. Enquanto o Comunismo procurava conquistar o proletariado, o Integralismo voltava-se para a classe média. O lema que adotara, "Deus, Pátria e Família", sensibilizava o público brasileiro. Apesar do alegado desígnio de oferecer apenas uma barreira à infiltração vermelha, angariando com isto a simpatia de várias correntes cristãs, inclusive altos dignitários da Igreja, do Governo e das Forças Armadas, o movimento alicerçava-se, à semelhança do Comunismo, em concepção totalitarista, reivindicando para o país um chefe supremo todo-poderoso e um único partido político. Sua simbologia imitava os padrões de Hitler e Mussolini – a camisa verde, a saudação indígena "Anauê" e as demonstrações militarizadas seguiam o figurino padrão do fascismo internacional. O movimento, porém, não teve vida longa. Perdeu toda a impulsão em maio de 1938, num golpe frustrado contra o Palácio Guanabara, na tentativa de depor Getúlio Vargas.
O Comunismo, revigorado pela adesão de Prestes, conseguiu grande expansão, infiltrando-se inclusive nas Forças Armadas, onde alguns jovens oficiais, em geral doutrinados desde os bancos escolares e insatisfeitos com os rumos da Revolução de 1930, foram atraídos pela personalidade do líder e pela retórica de renovação política e social que vinha nas resoluções do PCB.
À medida que o partido se ampliava, cresciam as dificuldades. Mais freqüentes tornavam-se os choques com o Integralismo e mais visado se mostrava o aparelho comunista. Sentiram os líderes a necessidade de criar uma frente ostensiva, que, mascarando a base ideológica comunista, permitisse o trabalho político legal para a conquista do poder. Resolvidos a tomar a ofensiva, fundaram em 30 de março de 1935 a Aliança Nacional Libertadora (ANL), organização de fachada, dentro da pura técnica das frentes únicas que em alguns países constituíram verdadeiras filiais do Partido Comunista. Assim, a ANL não era somente um "movimento antifascista", como apregoava. Era uma autêntica frente comunista. Embora nem todos os aliancistas fossem necessariamente comunistas, a orientação e as decisões eram formuladas integralmente pelo PCB. Prestes, aclamado presidente de honra da ANL, na reunião de 30 de março de 1935, no Teatro João Caetano, Rio de Janeiro, informou ao Secretário Nacional do PCB:
"Tomamos pelo único caminho que nos poderá realmente levar ao poder soviético e ao socialismo".
Em discurso proferido no VII Congresso da III Internacional reunido nos meses de agosto e setembro de 1935 em Moscou, o delegado Van Mine, membro do Comitê Executivo do Comintern e relator dos assuntos relativos à América do Sul, disse:
"Devo expor a todos os camaradas que se interessam pelo desenvolvimento e expansão do Comunismo na América Meridional que no Brasil já existe uma ampla e bem organizada associação, denominada Aliança Nacional Libertadora, e da qual já participa em grande número de oficiais do Exército e da Marinha Brasileira. Essa Aliança foi criada sob a orientação secreta, mas direta, do Partido Comunista Brasileiro, segundo as instruções confidenciais recebidas da Ligação Soviética em Montevidéu. Essa Aliança segue cegamente as ordens do nosso bravo camarada Prestes que foi, em numerosos comícios públicos realizados no Brasil, aclamado como seu chefe absoluto e presidente de honra."
4. ORDENS DE FORA
Antecipando-se à criação da Aliança Nacional Libertadora, em fins de 1934, as Conferências Comunistas da Grande Ásia e da América Latina já haviam deliberado iniciar a revolução comunista no Brasil, mesmo sem as condições ideais para a eclosão. A decisão foi tomada por sugestão do delegado russo Dimitri Sacharovich Manuilsky e de delegados brasileiros que acreditavam ser preferível uma ação rápida e violenta a uma demorada ação subversiva.
Para preparar e dirigir o movimento armado, o Komintern enviou o agitador internacional Arthur Ernest Ewert ou Harry Berger, ex-deputado comunista no Parlamento da Alemanha e processado em seu país natal por alta traição. Além dele chegaram Rodolpho Ghioldi, secretário geral do PC argentino, Pavel e Sofia, ucranianos, agentes da cúpula do Komintern, que se fizeram passar pelos belgas Léon Jules e Alphonsine Vallé e escaparam do Brasil em maio de 1936. Ainda podem ser citados o italiano Amleto Locatelli, conhecido por "Bruno", Johann de Graaf, conhecido por "Franz Gruber", a mulher de Arthur Ewert, Elise Saborowski, Olga Benário, incumbida de acompanhar Prestes ao Brasil, agente do serviço de espionagem russo, e outros.
Aproveitando-se da cobertura proporcionada pela ANL, da assessoria estrangeira e do regresso de Prestes, em abril de 1935, o PCB entrou em fase de grande movimentação: intrigava, conspirava, aliciava em todos os setores. Realizava infiltrações nos sindicatos e, particularmente, nos quartéis. Em sua tática de jogar uns contra os outros, os comunistas decidiram que em São Paulo e no Rio Grande do Sul a ANL devia pregar o separatismo; no Rio de Janeiro, deveria mobilizar a opinião pública contra os separatistas paulistas e gaúchos; no Norte e no Nordeste devia-se explorar o sentimento de revolta contra os privilégios concedidos ao Sul.
Eis o que escreveu Honório de Freitas Guimarães em seu livro Rapport suz l'arrestation du camarade Ewert. Moscou, 1938:
"Eu conduzi o camarada Ewert antes da chegada de Prestes ao Brasil aos simpatizantes de Niterói onde estava escondido o camarada Tampinha que deveria partir para o Nordeste em vista da intensificação do trabalho visando um levante pela constituição de sovietes, e o camarada Ewert lhe transmitiu uma série de experiências do movimento soviético chinês".
A técnica subversiva despertou a atenção das autoridades. A 11 de julho de 1935, pelo Decreto nº 229, o governo determinou o fechamento da ANL e a dissolução de outras frentes congêneres: a União Feminina do Brasil e a Aliança por Pão, Terra e Liberdade.
Os comunistas sentiram crescente oposição a suas atividades de propaganda e agitação. A polícia agia com energia, vasculhando arquivos e efetuando prisões que abalaram o movimento. Apesar disso, o Komintern exigia ação. Pressionado, Prestes concordou com o desencadeamento imediato do movimento armado. Em novembro, foi deflagrada a chamada intentona, que apesar de efêmera, manchou a história pátria com o sangue de numerosos brasileiros.
5. DESGOVERNO BOLCHEVISTA EM NATAL
Antecipando-se quatro dias a data prevista nos planos comunistas, a revolta eclodiu em Natal a 23 de novembro de 1935, um sábado. Os sargentos, cabos e soldados rebelados no 21º Batalhão de Caçadores, tiraram partido do meio expediente e, com o auxílio de civis extremistas, prenderam o oficial de dia e se apoderaram do armamento e da munição da unidade.
O Governador de Estado, Rafael Fernandes, e seus auxiliares, que assistiam a uma formatura no Teatro Carlos Gomes, ao tomar conhecimento da revolução, resolveram refugiar-se em um petroleiro da Air France. O Coronel José Otaviano Pinto Soares, comandante do batalhão, sem meios para reagir, procurou o quartel da Polícia Militar onde, juntamente com seu comandante, o Major Luís Júlio, organizou heróica resistência que durou das 20 horas do dia 23 até a manhã seguinte, apesar do intenso fogo assestado pelos comunistas contra o quartel . Sem munição, os legalistas tiveram de render-se, sendo levados para dois navios de guerra mexicanos que se encontravam no porto.
Caindo a última resistência, a cidade ficou inteiramente nas mãos do primeiro e último governo comunista que conseguiu implantar-se no Brasil. O Comitê Popular Revolucionário, que por três dias dirigiu o Rio Grande do Norte tinha como Ministro do Interior o funcionário Lauro Cortez Lago, o cérebro da revolta; Ministro da Defesa o Sargento Quintino Clementino de Barros, da Banda de Música do 21º Batalhão de Caçadores; Ministro do Abastecimento, o sapateiro José Praxedes de Andrade; Ministro das Finanças, o funcionário dos Correios e Telégrafos José Macedo; Ministro da Viação, o estudante João Batista Galvão. Por outro lado, assumiram o comando da guarnição federal e do 21º Batalhão de Caçadores, respectivamente, o Sargento Eliziel Diniz Henriques e o Cabo Estêvão. Cenas impressionantes ocorreram nessa ocasião. No dizer de Enock Garcia,
"começou a caça aos automóveis e caminhões públicos e particulares para as farras sangrentas da turma, que praticou violência de todos os matizes. Três dias e três noites de horror e desespero viveu a população pacata de Natal, constrangida a assistir, inerme, a dramaticidade dessas horas trágicas. Saques, estupros e arrombamentos foram praticados pelos comunistas. Os cofres do Banco do Brasil, da Delegacia Fiscal e da Recebedoria de Rendas foram abertos a maçarico e esvaziados".
Segundo posterior depoimento do Ministro da Viação,
"o povo de Natal topou a revolução de pura farra. Saquearam o depósito de material do 21º BC e todos passaram logo a andar fantasiados de soldado".
Visando a conquistar o restante do Estado, os comunistas organizaram-se em três colunas, chegando a ocupar as localidades de Ceará-Mirim, Baixa Verde, São José do Mipibu, Santa Cruz e Canguarentana.
A contra-revolução veio do interior. O chefe político do município de Seridó, Dinarte Mariz, mais tarde Governador do Estado, reuniu uma força de sertanejos, escassamente armados, e conseguiu destroçar os rebeldes em Serra Caiada; deixaram mortos e feridos e algum material bélico. Dinarte Mariz prosseguiu com sua força ocupando Panelas e terminando por travar com os rebeldes um último combate na serra do Doutor, onde dizimou os revoltosos. Ao mesmo tempo, o "Comitê Popular" tomava conhecimento do fracasso da revolta em Pernambuco e dos preparativos do 20º Batalhão de Caçadores de Alagoas, juntamente com a Polícia Militar da Paraíba, para invadir o Estado. Não havia mais esperanças de reforços. Só restava debandar. E os componentes do único governo comunista que se implantou no Brasil abandonaram Natal, atabalhoadamente, carregando consigo a vultosa quantia de 3 mil contos roubados dos cofres arrombados na cidade.
Tropas do Exército e das polícias estaduais capturaram em pouco tempo todos os implicados, que passaram a responder perante a Justiça por quase 20 mortes.
6. OBSTINADOS DO PAVILHÃO DO COMANDO
Dos três levantes comunistas de 1935, o de Pernambuco foi o mais sangrento, resultando, segundo Glauco Carneiro, "em cerca de 720 mortes, só nas operações da frente do Recife".
Quando eclodiu a revolta, encontravam-se ausentes do Estado, em viagem no dirigível Hindemburg LZ-129, o Governador Carlos de Lima Cavalcanti, o comandante da 7ª Região Militar, General Manuel Rabelo, e o comandante da Polícia Militar do Estado, Capitão Jurandir Bizarria Mamede. A ausência dessas autoridades poderia ter comprometido a reação legalista. Isto apenas não ocorreu em virtude de algumas circunstâncias favoráveis. A primeira circunstância foi a antecipação da revolta de Natal, que prejudicou a surpresa do movimento em Recife, encontrando a guarnição alerta e pronta para debelá-lo. A imediata resistência desenvolvida no interior do quartel do 29º Batalhão de Caçadores, a presteza da reação das tropas do Exército em Alagoas e na Paraíba e da Polícia Militar de Pernambuco desfizeram em curto prazo qualquer possibilidade de vitória comunista. Outro fator decisivo para sufocar o levante foi sem dúvida a atuação segura do Secretário de Segurança de Pernambuco, Capitão do Exército Malvino Reis Neto.
Prestes considerava Pernambuco de grande importância para os seus planos, por isso ali localizara a sede do secretariado para o Nordeste, designando para dirigi-lo o ex-Tenente do Exército Silo Soares Furtado de Meireles, homem de sua inteira confiança secundado por João Caetano Machado e Wilson de Souza Fonseca. A ação principal do PCB orientava-se para os operários da Companhia Great Western, uma ferrovia com sede em Jaboatão. No dia 17 de novembro, o Capitão Malvino sofrera um atentado ao procurar impedir uma greve. O tiro desferido atingiu e matou o 2º Tenente Lauro Leão dos Santos, então no comando de um pelotão que garantia o tráfego ferroviário entre Jaboatão e Recife. A morte provocou profunda revolta entre os companheiros do jovem oficial e deu força motivadora para a reação contra os comunistas, alguns dias mais tarde.
O movimento eclodiu na manhã do dia 24 de novembro, simultaneamente no quartel do 29º Batalhão de Caçadores e no quartel-general da 7ª Região Militar. Ao mesmo tempo, civis armados atacavam as delegacias de polícia de Olinda, Torre, Casa Amarela e a Cadeia Pública.
A revolta do 29º Batalhão de Caçadores aquartelado na Vila Militar Floriano Peixoto, em Socorro, foi liderada pelos Segundo-Tenentes Lamartine Coutinho Correia de Oliveira e Roberto Alberto Bomilcar Besouchet e os Sargentos José Avelino de Carvalho, Waldemar Diniz Henriques, Antônio Alves Damasceno e Augusto José Bezerra. Por volta das 9 horas o Tenente Lamartine levantara a 1ª Companhia e procurara prender todos que se lhe opunham, inclusive, após alguma reação, os Capitães Everardo de Barros e Vasconcelos e Frederico Mindelo Carneiro Monteiro. Estes dois oficiais, num golpe de audácia, conseguiram fugir e refugiar-se no Pavilhão do Comando, onde montaram obstinada resistência, fazendo que grande parte das forças rebeldes permanecesse contida no próprio quartel durante o período mais decisivo do combate. Como o 29º Batalhão de Caçadores estivesse a cerca de 18 quilômetros do centro, o Capitão Malvino conseguiu ganhar o tempo necessário para organizar as tropas e impedir a invasão de Recife.
O Tenente Lamartine tentou ainda dirigir-se ao centro da cidade, comandando a vanguarda das forças rebeldes, mas foi detido no Largo da Paz por tropas da Polícia Militar de Pernambuco.
No quartel-general da 7ª Região Militar o Sargento Gregório Lourenço Bezerra, chefiando um grupo de amotinados, deu ordem de prisão aos Tenentes Aguinaldo de Oliveira e José Sampaio Xavier. Ambos reagiram e quando sacavam as armas foram atingidos por descarga de fuzil, sendo o primeiro gravemente ferido e o segundo morto. Gregório também ferido foi preso pouco depois.
Em Olinda, um grupo de civis conseguiu apoderar-se dos pontos estratégicos da cidade, depois de prender o prefeito e outras autoridades. Um pequeno contingente de forças policiais dirigidos pelo delegado Rômulo de Oliveira Leite, entretanto, desbaratou-os rapidamente.
Na manhã do dia 25, segunda-feira, ainda havia combate no quartel do 29º Batalhão de Caçadores e no Largo da Paz. Os comunistas instalaram algumas metralhadoras pesadas na torre da igreja de Nossa Senhora da Paz, dificultando o ataque legalista. Para o local seguiu um grupo da Brigada Militar, chefiado pelo Capitão Higino Belarmino. Com a chegada de elementos do 29º Batalhão de Caçadores e de uma bateria de Artilharia da Paraíba, os comunistas pressionados começaram a recuar. Na altura do Engenho de Santana tiveram de enfrentar as forças do 20º Batalhão de Caçadores de Maceió, sendo batidos. Aqueles que conseguiram escapar uniram-se aos remanescentes de Socorro e fugiram desordenadamente para o interior, mas foram perseguidos e presos pelas tropas legais, à frente das quais estava o Major Costa Neto.
Na terça-feira, 26, cessara praticamente a luta em Recife e proximidades. Neste mesmo dia, com autorização do Congresso Nacional, o Presidente da República decretou a vigência do estado de sítio em todo o país.
7. FOGO E SANGUE NA PRAIA VERMELHA
O terceiro e mais importante surto subversivo eclodiu no Rio de Janeiro.
Os comunistas prepararam a insurreição em várias unidades militares. Alguns planos que foram posteriormente apreendidos com Harry Berger esclareciam que a rebelião deveria abranger também o Batalhão de Transmissões e o 2º Regimento de Infantaria, na Vila Militar. No Centro de Preparação de Oficiais da Reserva, no Grupo de Obuses, de São Cristóvão e no Ministério da Guerra realizar-se-iam ações de pequena amplitude, baseadas principalmente na audácia de oficiais especialmente selecionados para empreendê-las. Os civis só participariam do combate quando este se estendesse às ruas.
O 3º Regimento de Infantaria, comandado pelo Coronel José Fernando Afonso Ferreira estava aquartelado na Praia Vermelha, onde até 1904 funcionara a Escola Militar. A unidade possuía armamento moderno e seu efetivo era grande – cerca de 1.700 soldados, além de 100 oficiais e 200 sargentos. Desde algum tempo seus quadros vinham sendo infiltrados por comunistas. O Capitão Agildo da Gama Barata Ribeiro, um marxista notório, para lá fora encaminhado a fim de cumprir uma punição disciplinar de 20 dias, mas certamente esse não era o local mais apropriado para recolhê-lo. Agildo participara ativamente das revoluções de 1930 e 32 e posteriormente aderira ao comunismo, tornando-se um dos seus mais ferrenhos adeptos. Ao ingressar no 3º Regimento de Infantaria, em 8 de novembro de 1935, Agildo recebeu a comunicação de Francisco Moésia Rolim para se articular com o Tenente Francisco Antônio Leivas Otero, que liderava a célula do Partido Comunista. Logo assumiu a liderança dos preparativos para o levante, reformulando planos e redistribuindo missões. Em quase todas as companhias do regimento existia pelo menos um elemento em condições de prender os oficiais e as praças legalistas e de assumir o comando no momento oportuno.
Na tarde de 26 de novembro, o 3º Regimento de Infantaria encontrava-se em prontidão por causa dos acontecimentos no Nordeste. Além disto, o comandante da unidade, ao inteirar-se das atitudes suspeitas de alguns oficiais, "ordenara que as companhias e pelotões estacionassem no pátio do quartel ou ficassem de prontidão em seus próprios alojamentos, prontos para reprimir qualquer levante". Nessa mesma tarde o Capitão Agildo recebeu a ordem assinada por Prestes:
"O 3º Regimento Popular Revolucionário deverá levantar-se às duas da madrugada de 27 de novembro e a partir de 3 horas deslocar tropas para as proximidades do Arsenal de Marinha e do Palácio do Catete, devendo outras impedir a ação da Polícia Especial e do Batalhão da Polícia Militar da rua São Clemente."
Na hora prevista ouviram-se tiros no pelotão do Tenente Leivas Otero, um dos revoltosos. Era o sinal esperado. Imediatamente os amotinados passaram a aprisionar os legalistas, que diante da surpresa e da rapidez da ação ofereciam pouca ou nenhuma resistência. Todavia, as companhias de metralhadoras dos I e II Batalhões, comandadas pelos Capitães Alexínio Bittencourt e Álvaro Braga, não se intimidaram e responderam ao fogo, estabelecendo-se cerrado tiroteio que alertava os observadores, escondidos nas vertentes dos morros circunvizinhos ao 3º Regimento de Infantaria. O governo foi imediatamente avisado. Nessa ocasião um oficial legalista, o Major Misael de Mendonça, foi atingido mortalmente.
Em companhia de alguns oficiais, o Coronel Afonso Ferreira ficou isolado na cúpula do pavilhão principal e, como nada pudesse fazer, comunicou-se pelo telefone com o Ministro da Guerra, informando-lhe a situação. Mais tarde, por intervenção dos comandantes dos dois batalhões, querendo evitar maior sacrifício de vidas depois de horas de luta, os núcleos de resistência legalista renderam-se. Os últimos a serem presos foram o Coronel Afonso Ferreira e os oficiais que com ele se encontravam, pois desmoronou a parte do prédio onde estavam abrigados.
Apesar de terem dominado a unidade, os rebeldes não puderam cumprir as ordens de Prestes. É que nessa ocasião tropas da 1ª Região Militar comandadas pelo General Eurico Gaspar Dutra impediam que os comunistas deixassem o quartel.
Intimado a render-se, Agildo Barata negou-se, talvez porque não soubesse que o levante na Escola de Aviação malograra. Diante dessa negativa as tropas legalistas intensificaram os fogos. O quartel converteu-se em enorme fogueira, com o emprego de granadas incendiárias. Era impossível resistir. Pouco depois do meio-dia surgiu uma bandeira branca entre os escombros.
8. VIOLÊNCIAS CONTRA HOMENS DESARMADOS.
Simultaneamente, na região do Campo dos Afonsos levantou-se parte da guarnição da Escola de Aviação Militar, vínculada à Aviação do Exército, comandada pelo Tenente-Coronel Ivo Borges e que se localizava à margem da antiga estrada Rio – São Paulo. Delimitava-se com o 1º Regimento de Aviação, comandado pelo Tenente-Coronel Eduardo Gomes, antigo revolucionário de 1922. A segurança de ambas as organizações militares era muito deficiente, pois quase não possuíam muros ou cercas de proteção.
Na Escola de Aviação a propaganda comunista procurava aliciar adeptos, dirigida pelos Capitães Agliberto Vieira de Azevedo e Sócrates Gonçalves da Silva, Tenentes Benedito de Carvalho, Ivan Ramos Ribeiro, Dinarco Reis, Carlos Brunswick França e José Gay da Cunha, o Aspirante Walter José Benjamim da Silva, além de graduados e praças.
Desde setembro de 1935 a Escola vivia um clima de crescente inquietação, com o aparecimento, entre os alunos, de boletins de propaganda comunista. Várias sindicâncias foram realizadas, sem descobrir o responsável. Às vésperas do dia 27 de novembro foi encontrado com o Capitão Sócrates Gonçalves da Silva um pacote com panfletos subversivos. O comandante determinou que o capitão fosse recolhido preso, mas ele desapareceu. Admitindo a anormalidade do que ali se passava, o Tenente-Coronel Borges mandou aumentar a vigilância e proibiu a entrada de qualquer veículo no quartel fora do expediente. Pouco depois das 14 horas, o comandante resolveu fiscalizar pessoalmente o cumprimento de suas instruções. Ele percorria com o Major Bento Ribeiro Carneiro e o Capitão Jorge Gomes Ramos os diversos postos de sentinelas quando observou o automóvel do Capitão Sócrates, em alta velocidade, penetrando por um dos portões da Escola. O sargento comandante da guarda, conivente, facilitara sua entrada.
Logo em seguida ouviram-se tiros, gritos e correrias. Eclodira e rapidamente se alastrara o movimento cuja repressão foi dificultada pela escuridão e pela confusão generalizada. Sucederam-se lances dramáticos, com atos de heroísmo e de covardia. De acordo com Glauco Carneiro,
"dois oficiais legalistas, Capitão Armando de Souza e Melo e o Tenente Danilo Paladini, foram mortos na ocasião, diz-se que ainda dormindo, por Agliberto e Ivan".
O mesmo Capitão Agliberto assassinou o Tenente Benedito Lopes Bragança, quando este se encontrava preso, desarmado e incapaz de qualquer reação.
Senhores da situação, de posse de todo o armamento e munição retirados das reservas e do paiol, o próximo passo dos comunistas foi ocupar os hangares, a fim de acionar os aviões e com isso alastrar o movimento. O 1º Regimento de Aviação, com o Tenente-Coronel Eduardo Gomes, conseguiu repelir o assalto, retardando os amotinados até que o General José Joaquim de Andrade manobrasse o Regimento Andrade Neves contra os rebeldes. Às 17 horas os comunistas debandavam em fuga.
Os rebeldes prisioneiros foram colocados no navio Pedro l, transformado em barco-presídio.
9. POVO SEM ÓDIOS NÃO ACEITA A VIOLÊNCIA COMO RELIGIÃO
Na Praia Vermelha ergue-se hoje um monumento em honra das vítimas da intentona comunista de 1935: Tenente-Coronel Misael de Mendonça, Majores Armando de Souza e Melo e João Ribeiro Pinheiro; Capitães Danilo Paladini, Geraldo de Oliveira, Benedito Lopes Bragança; 2ºs Tenentes José Sampaio Xavier e Lauro Leão de Santa Rosa; 2ºs Sargentos José Bernardo Rosa e Jaime Pantaleão de Moraes; 3ºs Sargentos Coriolano Ferreira Santiago, Abdiel Ribeiro dos Santos e Gregório Soares; 1ºs Cabos Luís Augusto Pereira e Antônio Carlos Botelho; 2ºs Cabos Alberto Bernardino de Aragão, Pedro Maria Netto. Fidelis Batista de Aguiar, José Hermito de Sá, Clodoaldo Ursulano, Manuel Biré de Agrella e Francisco Alves da Rocha; e Soldados Luís Gonzaga, Wilson França, Pércicles Leal Bezerra, Orlando Henriques, Lino Vitor dos Santos, João de Deus Araújo, Álvaro de Souza Pereira e Generoso Pedro Lima.
Após a derrota da intentona, os agentes soviéticos conseguiram retornar a Moscou, onde escreveram seus relatórios. Foram todos liquidados no Grande Expurgo stalinista de 1937/38. Amleto Locatelli morreu na Guerra Civil Espanhola. A Gestapo matou as agentes Olga Benário e Elise Saborowski. Prestes foi preso no Méier, Rio de Janeiro, em março de 1936, e nessa condição permaneceu até o mês de abril de 1945. Em 1943, mesmo na prisão, foi eleito secretário-geral do Partido Comunista, permanecendo no cargo até 1980.
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