domingo, 18 de março de 2012

Ambientalismo sem paixões.



As margens dos rios devem ser preservadas, mas os parâmetros dessa proteção devem excluir as paixões 
PARTICIPEI NESTA semana do Fórum Mundial da Água como senadora e representante dos produtores rurais do Brasil, para associar-me aos esforços que o mundo todo deve fazer para conciliar as exigências da produção agrícola, e da própria vida humana, com a conservação dos recursos hídricos. Até 40 anos atrás, o Brasil era um grande importador de alimentos, mas a nossa produção rural transformou-se e nos tornamos um dos maiores produtores do planeta e um dos mais importantes exportadores de alimentos. O Brasil dispõe de uma das maiores reservas de água doce do mundo (12%), com milhares de rios que cortam o país em todas as latitudes, e de grandes reservas de águas subterrâneas. 
Diferentemente dos demais países de grande expressão demográfica, não sofremos, na maior parte do nosso território, de limitação de água. Nossa agricultura irrigada tem pequena participação na produção total, pois o regime de chuvas, salvo em algumas áreas, é adequado às condições de produção. Ao longo da formação histórica do Brasil, do mesmo modo como aconteceu em todas as partes do mundo civilizado, nem sempre a produção rural e a conservação dos recursos naturais estiveram em harmonia. A própria ideia de que os recursos da terra são limitados e finitos é uma noção recente. É uma consciência que vem ganhando força progressivamente. 
Hoje, no entanto, podemos dizer que produzimos muito, com práticas modernas e adequadas, sob uma legislação ambiental bastante rigorosa e detalhada. Estamos, neste momento, finalizando a atualização e a modernização da legislação ambiental, cujo maior mérito é o de expressar um genuíno consenso social, o que tornará sua aplicação muito mais espontânea e efetiva, sem a necessidade de um exército de fiscais para forçar seu cumprimento. O mundo precisa que a produção brasileira de alimentos continue crescendo por meio do aumento da produtividade. O crescimento demográfico e o aumento da renda que se observa em todas as partes do mundo em desenvolvimento, pelos avanços da globalização e do comércio internacional, vão exigir uma oferta maior de alimentos nos próximos anos. 
A escassez de terras aráveis e as limitações da oferta de água restringem a expansão da produção, na maior parte do mundo. O Brasil, felizmente, tem ainda abundância de terras agricultáveis, bem como uma disponibilidade bastante ampla de água, o que torna nosso país uma das poucas alternativas para o abastecimento da população da terra. Desde o início da civilização humana, na Ásia, até hoje, na Europa, os produtores procuraram as margens dos rios para produzir e para habitar. O Brasil tem uma legislação que fixa normas de proteção com vegetação natural às margens dos rios, em torno das nascentes e nas áreas de recarga. 
O aumento da produtividade e as novas técnicas de produção permitem, hoje, que as margens dos rios sejam preservadas, para que o volume e a qualidade das águas sejam protegidos. Mas os parâmetros dessa proteção devem ser fixados com base nas razões da ciência -e não de paixões políticas. Os benefícios de rios preservados se estendem a toda a sociedade, são benefícios públicos. Os custos de preservação, no entanto, recaem unicamente sobre o produtor. O equilíbrio das relações sociais e a própria efetividade da norma ambiental estariam muito mais bem servidos se o Estado encontrasse mecanismos financeiros capazes de retribuir o produtor, distribuindo os encargos com o conjunto da sociedade. 
Estamos propondo que o modelo brasileiro de preservação das margens dos rios e nascentes -nossas Áreas de Proteção Permanente, as APPs- seja também adotado por todos os países do mundo, para que o Reno, o Danúbio, o Mississippi e o rio Amarelo possam ser protegidos por lei, como o Amazonas, o São Francisco, o Paraná, o Araguaia, o Tocantins, em benefício da humanidade e das gerações futuras, pois é exatamente a água que faz com que a vida não se contenha. 
KÁTIA ABREU, 50, senadora (PSD-TO) e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), escreve aos sábados, a cada 14 dias, neste espaço, na Folha de São Paulo.

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