quinta-feira, 11 de março de 2021

FÉRIAS EM PERNAMBUCO (CONTO)



Por, Lourinaldo T. Bezerra.


Haviam vestígios claros da presença dela naquela sala, por isso procurei-a por toda parte, mas não a encontrei ali. Voltei, então, à praça e lá estava ela a sorrir de mim...
Cumprimentou-me com um beijinho de “olá”, seja bem-vindo, e começamos a conversar. Contou tudo sobre os seus desencontros no amor e pude sentir a sua decepção com relacionamentos. Eu, também, contei-lhe sobre algumas situações análogas às que ela passara e nos situamos na conversa.

Depois de algum tempo concordamos em irmos fazer um pequeno lanche, pois já passava das 16:00 h. Escolhemos uma casa de chás ali pertinho e para lá nos dirigimos. Após nos acomodarmos no ambiente, pedimos à moça atendente o que pretendíamos comer e beber.

A nossa conversa mudara de tema, agora estávamos falando da nossa profissão, qual seja advocacia. Enveredamos por casos ganhos e perdidos, discutimos jurisprudência e terminamos concordando em muitos tópicos. Por fim, tratamos, também, sobre coisas do nosso dia a dia. Terminamos o nosso lanche e acertamos em nos encontrarmos no dia seguinte no fórum da cidade.

Mas, à noite ela me ligou desmarcando o nosso encontro, devido ao surgimento de um problema o qual ela teria que resolver ao amanhecer. Deixamos para a sexta-feira depois do almoço na mesma praça em frente ao fórum. Nos encontramos e nos cumprimentamos com beijinhos e abraços apertados e gostosos.

Sentamo-nos num dos bancos ali existentes e começamos a conversar.
Ela contou-me sobre o problema que resolvera na quarta-feira passada, quando não pudemos nos encontrar e me disse que tudo ficara resolvido.
Então, entramos num terreno que nos agradava muito: amor!
Confesso que não esperava muito dela, mas me espantei com o resultado do nosso colóquio naquela praça.
Progredimos tanto numa relação a dois que assumimos um compromisso logo de cara.

Vimos que nos daríamos muito bem se namorássemos...
E assim o fizemos, estávamos namorando, tínhamos muito o que ganharmos com aquela relação já que éramos advogados e tínhamos tantos pontos em comum.
A partir do momento em que consentimos em sermos namorados, tudo passou a ser muito mais agradável entre nós.
Estávamos nos apaixonando muito rapidamente.
Em sua casa estudávamos casos dela e na minha casa passávamos a limpo meus casos mais espinhosos.
A lucratividade entre nós, do ponto de vista profissional, era muito boa, mas estava um tanto quanto secundário: o amor.

Depois de alguns casos ganhos, tanto da minha parte quanto da parte dela, passamos a nos divertir mais.
Fomos a muitos shows, concertos sinfônicos, cinemas, praia, etc.
Até que, aproximando-se a primavera, vimos que estavam quase coincidindo as datas em que sairíamos de férias.
Cada um verificou o que poderia ser ajustado para que uma data fosse estipulada para o evento.

E conseguimos os ajustes necessários para a nossa viagem ao Nordeste do Brasil, em setembro vindouro.
Nos preparamos bem, compramos algumas coisas que precisaríamos na viagem e embarcamos no Aeroporto de Cumbica, exatamente às 9:45h do dia 3 de setembro de 2001, rumo a Recife. Exatamente às 12:45h do mesmo dia chegamos a Recife, onde o Sol fazia brilhar a maravilhosa capital do estado de Pernambuco.
Fomos diretamente para o hotel em Boa Viagem, descansamos da viagem e nos amamos com um ardor incrível.
Estávamos muito felizes naquele quarto de hotel na Rua dos Navegantes, no bairro de Boa Viagem.


                                   Praia de Boa Viagem, Recife.


Da janela do nosso apartamento não víamos o mar, mas estávamos bem pertinho dele, a ponto de sentirmos o cheiro característico da maresia.
Tomamos uma chuveirada e fomos almoçar ali mesmo no restaurante do hotel.
Comemos uma peixada à moda da casa, uma delícia.
Após voltarmos ao apartamento para escovarmos os dentes e nos vestirmos adequadamente para o ambiente de praia, descemos e nos dirigimos ao calçadão da Av. Boa Viagem.

Tomamos uma água de coco para saciar a sede que a peixada proporcionou e fomos caminhar pela avenida movimentada.
De repente aconteceu o inesperado!
Alguns tiros foram disparados em algum lugar ali por perto e ficamos atônitos sem saber o que fazermos.
Ao ver uma barraca de cocos nas proximidades, peguei na mão da Beth, e corremos abaixados para nos abrigarmos. Só então vimos que ela havia sido atingida de raspão por um projétil no ombro direito, que sangrava muito.
Ela sentiu a umidade escorrendo por seu braço e num grito desesperador me mostrou a lista de sangue ao longo do membro atingido.
Real Hospital Português de Boa Viagem 



Chamei um Uber e em menos de 10 minutos estávamos no pronto atendimento do Real Hospital Português de Boa Viagem, a cerca de 1 km de onde ocorreu o acidente. O PS do Real Hospital Português, é um espetáculo de nosocômio. O atendimento é de primeiro mundo em todos os aspectos.

Examinado o ferimento, o médico disse que não havia nenhuma gravidade, mas que ela precisava repousar por, pelo menos, dois dias até ser descartada a possibilidade de infecção. Fomos direto para o hotel e lá ficamos tomando os cuidados necessários. Pela televisão, soubemos do ocorrido naquela tarde quando passeávamos pelo calçadão da Av. Boa Viagem.

Uma discussão idiota entre dois empresários locais provocara a reação de um dos dois contendentes, que meio bêbado, sacara a arma e disparara a esmo, sem acertar, entanto, seu oponente, mas quase provocando uma tragédia entre nós dois.

Informamos à polícia sobre o ocorrido, duas horas após chegarmos ao hotel.
Através de um telefonema, eu me comuniquei com o delegado plantonista na Delegacia de Boa Viagem, e marcamos para o final da tarde a minha oitiva.

Compareci à delegacia e dei meu depoimento, apresentando o laudo médico que me foi fornecido no PS, onde a Beth fora atendida. Formalizada a queixa e feito o Boletim de Ocorrência, voltei ao hotel, onde encontrei minha amada dormindo. Dei-lhe um beijinho e deitei-me ao seu lado onde adormeci por umas três horas.

No dia seguinte, o ombro da Beth parecia bem melhor, quase cicatrizado.
Trocamos o curativo no PS, e fomos almoçar na praia de Barra de Jangadas, ao sul de onde estávamos.

O ferimento no ombro da minha gatinha não incomodava tanto, sendo assim concordamos em irmos a São José da Coroa Grande, no dia seguinte. Mas, não sem antes passarmos em Porto de Galinhas, cidade turística pernambucana, a qual era um sonho de Beth, conhecer.

No outro dia, uma manhã de um sábado ensolarado, alugamos um carro e fomos para o litoral sul de Pernambuco, um paraíso na Terra. Percorremos a PE-60 em quase toda a sua extensão e entramos em Porto de Galinhas, por volta das 8:30 h daquela manhã.


Porto de galinhas

Andamos ao longo da praia e um jangadeiro nos ofereceu um passeio até os bancos de areia no meio do mar. Infelizmente não pudemos fazer o passeio tão desejado por Beth, pois ela já sabia daquele périplo de praxe para quem visita Porto de Galinhas.
É que o ombro ferido dela a impedia de entrar no mar já que poderia infeccionar o ferimento que ainda estava recente.

Lamentamos e acertamos para voltarmos lá no próximo ano, quando ficaríamos hospedados no resort que lá existe e que é excelente. Foi então que me lembrei de um medicamento fabricado em Recife, que cicatriza milagrosamente qualquer ferimento em questão de horas.

Seguimos viagem pela PE-60, até São José da Coroa Grande, em seguida, e em lá chegando fomos a uma farmácia, onde eu comprei um frasco de “Sanativo”, gaze, água oxigenada a 10 volumes e esparadrapo.


Esse medicamento, o “Sanativo”, é fabricado com extrato de mandacaru, angico e aroeira. São três plantas medicinais da região Nordeste, bastante usadas pelos cangaceiros de Lampião, na época do cangaço em Pernambuco, os quais usavam as três plantas para curarem seus ferimentos diversos.

Retirei o curativo do ombro de Beth, limpei bem com água oxigenada e pedi a ela que mordesse a toalha de rosto da pousada onde estávamos e apliquei umas gotinhas do medicamento milagroso ao longo do corte feito pela bala. Ela fez uma carinha de pavor por causa da dor intensa que o medicamento provoca, mas logo se acalmou. Cobri o ferimento, quase cicatrizado, com um novo curativo e fomos conhecer os arredores.
Igreja de São José


Percorremos a pé a rua de trás da pousada até a igrejinha matriz na praça central de São José, onde adentramos o templo secular para que ela pudesse conhecer.
Ela ficou deslumbrada com a riqueza de detalhes em ouro que existe no altar-mor da igrejinha fundada em meados do século XIX.
Na saída da igrejinha, um rapaz que conhecemos na pracinha da matriz, nos informou que poderíamos alugar um buggy e irmos até a Fazenda Morim, um passeio turístico muito concorrido. Aceitamos a sugestão do rapaz e fomos conhecer a Fazenda Morim, um verdadeiro sonho através do tempo.
Interior da sede da Fazenda Morim (sala de jantar)

A imponente sede da Fazenda Morim

Vista aérea da sede da Fazenda Morim



Depois de meia hora de viagem por uma estrada de terra batida de ótima qualidade à bordo de um buggy amarelo pilotado por Arnaldo Ferreira, o nosso motorista, chegamos em frente à imponente sede da fazenda. Era uma maravilha construída no século XVIII, pela baronesa Gindahy, em pleno sucesso da produção de açúcar no Estado.

A fazenda tem 1129 hectares, em sua maior parte constituída de mata atlântica muito bem preservada. O interior da sede da fazenda é um deslumbre arquitetônico da época colonial portuguesa. Percorremos todo o interior do prédio secular para encanto da minha Beth, que ficou felicíssima quando soube que essa fazenda foi citada no célebre livro do mestre Gilberto Freire: “Casa-Grande & Senzala”.
Rodamos uns 20 quilômetros dentro da propriedade, através de uma estradinha que margeia o açude local e voltamos esfomeados para São José.

Foi um passeio deslumbrante para nós.

Por sugestão do Arnaldo, o nosso motorista, fomos almoçar no “Calamares”, um dos bons restaurantes da Cidade. Nos deliciamos com frutos do mar, apesar do ferimento no ombro da minha amada, que dizem não ser de bom alvitre comer esse tipo de comida quando estiver curando um ferimento. Crendices.
Frutos do mar no Restaurante Calamares


Após o farto repasto, fomos tirar uma soneca na pousada onde estávamos hospedados, que ninguém é de ferro.

Acordamos por volta das 15:30 h, pegamos nosso carro e fomos até a praia de Maragogi, já no estado de Alagoas, já que estávamos exatamente na divisa dos dois estados.


Praia de Maragogi, AL

Maragogi é famosíssima nos roteiros turísticos por ser uma das mais lindas praias do Brasil. Rodamos 10 kms até a praia, pela AL-101, e desfrutamos de uma visão fenomenal.

Devo esclarecer que sou filho natural do estado em que estávamos, Pernambuco, mas a minha namorada é paulistana e ainda não conhecia nada por lá.

Depois do nosso super agradável passeio pelo litoral sul de Pernambuco, retornamos a Recife, depois do café da manhã do domingo

Após deixarmos nossa bagagem no nosso apartamento no hotel em Boa Viagem, e almoçarmos, nos dirigimos a Olinda, cidade histórica, próxima a Recife, visita obrigatória de todos que visitam a capital do estado.

Porém, quase me esquecia de mostrar à minha amada, o magnífico "Castelo de Brennand" no imenso parque da família, por trás do Q. G. do Exército do Nordeste. A visitação dura apenas 3 horas e dificilmente se poderá ver toda a coleção de armas do maior museu particular de armas antigas da América Latina. Com mais de 10 mil peças, o museu fica instalado majestosamente num castelo projetado e construído pelo fundador, para esse fim, onde existem todos os tipos de armas e armaduras da Idade Média.

Castelo de Brenand


Interior do Museu de Armas Antigas




Armaduras medievais




Em Olinda, visitamos várias igrejas - lá existem 23 igrejas seculares -  cada uma mais linda do que a anterior.
Olinda, vendo-se ao fundo a cidade de Recife.

Terminamos o passeio na igreja matriz, que fica numa das muitas colinas, a mais elevada, em que situa-se a bela cidade de Olinda.
Mosteiro de São Bento, Olinda






Rua de Olinda










Voltamos ao hotel e nos preparamos para jantarmos. O nosso final de semana foi maravilhoso, mesmo tendo acontecido o quase trágico caso na Av. Boa Viagem, no dia da nossa chegada à capital pernambucana.

A respeito disso, eu entrei, como procurador de Beth, com uma queixa-crime contra o atirador, um empresário recifense, quando pedi, através de medida judicial, uma indenização por tentativa de homicídio no valor de R$ 250.000,00 (duzentos e cinquenta mil reais).

Já em São Paulo, meses depois, recebi um telefonema do advogado do réu, o qual me fez uma proposta de indenização à vista no valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais).
Em concordância com a Beth, eu dei o meu aceite e acertamos tudo num cartório de São Paulo, por meio de precatória.

Esse valor custeou, com sobra, a nossa lua de mel em Paris, no ano seguinte, já que pretendíamos nos casar na próxima primavera.

A advogada, Elizabeth Sá Cordeiro Celibelli, e o advogado, Luiz Albuquerque dos Santos Mattos, casaram-se na igreja de Nossa Senhora do Brasil, Jardim Europa, no dia 6 de setembro de 2003, um lindo sábado ensolarado, como gostavam.